terça-feira, 20 de novembro de 2012

A REFORMA E A MISSÃO

A PRESENÇA DA IGREJA COMO AGENTE DE EXPANSÃO DA PALAVRA PREGADA

A Reforma Protestante desencadeada com as 95 teses de Lutero divulgadas em 31 de outubro de 1517 foi sobretudo eclesiástica em um momento em que todos os olhares se voltavam para a reestruturação daquilo que a Igreja cria e vivia. Renasceram assim os dogmas evangélicos. A Sola Scriptura defendia uma Igreja centrada nas Escrituras, Palavra de Deus; a Sola Gratia reconhecia a salvação e vida cristã fundamentadas na Graça do Senhor e não nas obras humanas; a Sola Fide evocava a fé e o compromisso de fidelidade com o Senhor Jesus; a Solus Christus anunciava que o próprio Cristo estava construindo Sua Igreja na terra sendo seu único Senhor e a Soli Deo Gloria enfatizava que a finalidade maior da Igreja era glorificar a Deus.

A Missão da Igreja, sua Vox Clamantis, não fez parte dos temas defendidos e pregados na Reforma Protestante de forma direta. Isto por um motivo óbvio: os reformadores como Lutero, Calvino e Zuínglio possuíam em suas mãos o grande desafio de reconduzir a Igreja à Palavra de Deus e assim todos os escritos foram revestidos por uma forte convicção eclesiológica e sem uma preocupação imediata com a missiologia. Isto não dilui, entretanto, a profunda ligação entre a reforma e a obra missionária por alguns motivos:
a) A Reforma levou a Igreja a crer que o curso de sua vida e razão de existir deveriam ser conduzidos pela Palavra de Deus (submetendo o próprio sacerdócio a este crivo bíblico) e foi justamente esta ênfase escriturística que despertou Lutero para a tradução da Palavra na língua do povo e inspirou posteriormente centenas de traduções populares em diversos idiomas fomentando posteriormente movimentos como a Wycliffe Bible Translators, com a visão da tradução das Escrituras para todas as línguas entre todos os povos da terra. Hoje contamos com a Palavra do Senhor traduzida para 2.212 línguas vivas. João Calvino enfatizava que “... onde quer que vejamos a Palavra de Deus pregada e ouvida em toda a sua pureza... não há dúvida de que existe uma Igreja de Deus ”. O grande esforço missionário para a tradução bíblica resulta diretamente dos ensinos reformados.
b) A Reforma reavivou o culto onde todos os salvos, e não apenas o sacerdote, louvavam e buscavam a Deus. E Lutero em uma de suas primeiras atitudes colocou em linguagem comum os hinos entoados nos cultos. Esta convicção de que é possível ao homem comum louvar a Deus incorporou na Igreja pós reforma o pensamento multiétnico onde “o desejo de levar o culto a todos os homens”, como disse Zuínglio, não demorou a ressoar na Igreja culminando com o envio de missionários para o Ceilão pela Igreja Reformada holandesa no século XVII. Tal fato disparou um progressivo envio missionário e expansão da fé Cristã nos séculos que viriam. Um culto vivo ao Deus vivo foi um dos pressupostos reformados que induziu a obra missionária a levar este culto a todos os homens transpondo barreiras linguísticas, culturais e geográficas.
c) A Reforma trouxe a Glória de Deus como motivo de vida da Igreja e isto definiu o curso de todo o movimento missionário pós reforma onde o estandarte de Cristo, e não da Igreja, era levado com a Palavra proclamada entre outros povos. Os morávios já testificavam isto quando o conde Zinzendorf, ao ser questionado sobre seu real motivo para tão expressivo e sacrificial movimento missionário, responde: “estou indo buscar para o Cordeiro o galardão do Seu sacrifício”. John Knox na segunda metade do século XVI escreveu que a Genebra de Calvino era “a mais perfeita escola de Cristo que jamais houve na terra desde a época dos apóstolos”. O centro das atenções portanto era Cristo e nascia ali um modelo cristocêntrico de pregação do evangelho que marcaria o curso da história missionária nos séculos posteriores.
Mas, sobretudo, a Reforma Protestante submeteu a Igreja ao crivo da Palavra e isto revelou-nos a nossa identidade bíblica, segundo o coração de Deus. Seguindo o esboço desta eclesiologia reformada poderemos concluir que somos uma comunidade chamada e salva pelo Senhor com uma finalidade na terra. Zuínglio, logo após manifestar sua intenção de passar a pregar apenas sermões expositivos em janeiro de 1519, afirmou em sua primeira prédica que “a salvação põe sobre nós a responsabilidade de obediência ”.

Seguindo esta ênfase eclesiológica sob cunho escriturístico vemos que Ekklesia, Igreja, é um termo composto que pode ser dividido em "Ek" (para fora de) e "Klesia", que vem de "Kaleo” (chamar). Etimologicamente pode, portanto, ser entendida como "chamada para fora de" o que a principio nos dá uma ideia mais real desta comunidade dos santos que entra em um templo mas precisa postar seus olhos além muros. Obviamente o termo também está ligado a "agrupamento de indivíduos" e de certa forma a "instituição" porém, em todo o N.T. adquire o conceito de "comunidade dos santos" e fora MT. 16:18 e 18:17 está ausente dos evangelhos aparecendo, porém, 23 vezes em Atos e mais de 100 vezes em todo o Novo Testamento. Gostaria que déssemos atenção neste momento a alguns conceitos neotestamentários e reformados para esta comunidade dos filhos de Deus que foram demoradamente estudados pelos reformadores e impulsionam a Igreja hoje para uma obra missionária baseada na Sola Scriptura e para a glória de Deus.
1. Igreja de Deus
Comumente encontramos no N.T. a expressão "Igreja de Deus” ("Ekklesia tou Theou") o que evidencia que esta Igreja veio de Deus e pertence a Deus. É uma comunidade que possui Deus como fonte; é eterna, espiritual e universal. Não provém de elucidação humana ou de uma obsessão nutrida por um grupo de loucos há 20 séculos, antes foi articulada por Deus, formada por Deus, é pertencente a Deus e permanece ligada a Deus. Independente das deturpações da fé, das ramificações que se liberalizaram, dos que se perderam pelo caminho, a Igreja permanece, pois é posse de Deus.

Desta forma a “Ekklesia tou Theou” necessita caminhar de acordo com o palpitar do coração de Deus, a quem pertence, traduzindo para sua vida os desejos profundos deste coração. É baseados nesta verdade que necessitamos renovar nosso compromisso com a eclesiologia bíblica – um grupo de santos chamado por Deus para a inusitada tarefa de transtornarem o mundo com o evangelho de Cristo.
2. Igreja local
Também no N.T. encontramos o conceito de "igreja local". Em 1o Co 1:12 vemos, por exemplo, a expressão "Igreja de Deus que está em Corinto", onde "que está" (“te ouse”) indica a localidade da igreja. Mostra-nos que os santos de Corinto pertencem à Igreja, e não que a Igreja pertence à Corinto, o que deve ficar bem claro. Nos últimos 2.000 anos a Igreja adquiriu uma forte tendência de se "localizar" condicionando-se tão fortemente a uma cidade ou bairro a ponto de alguns chegarem a defender uma "demarcação" geográfica da responsabilidade da Igreja impedindo trabalhos fora da sua "jurisdição".

Num conceito neotestamentário "Igreja" é uma comunidade sem fronteiras e, portanto, creio que há necessidade de sacramentalizarmos mais os santos e menos os templos. Missões não é um programa eclesiástico, é a respiração da Igreja. Lembro que na tribo Konkomba no oeste africano há uma expressão que diz: “respiração é vida – não é preciso pensar para respirar; não é preciso pensar para viver”.
3. Igreja humana
Também dentro do conceito de "Igreja" nos deparamos no N.T. com um perfil bastante humano. Em 1 Ts 1.1 por exemplo vemos "igreja de Tessalônica" ("ekklesia Thesalonikeon") dando-nos a ideia daqueles que são Igreja também sendo Tessalônicos, cidadãos de Tessalônica.
Mostra-nos o fato de que por serem "Igreja" não significa que deixam de ser cidadãos, patriotas, carpinteiros, lavradores, comerciantes, desportistas, pais, mães ou filhos. "Igreja" no N.T. não é apresentada como uma comunidade alienante, mas como uma comunidade que abrange o homem em seu contexto humano fazendo-nos entender que esta Igreja não foi separada do mundo e sim purificada dentro dele. Mostra-nos também que na obra missionária não há super homens mas sim gente como a gente tendo o privilégio de espalhar o Evangelho de Cristo além fronteiras.

No livro de Atos, a humanidade passo a passo era chocada com a fé daqueles que "transtornavam o mundo", onde o viver é Cristo, o objetivo era ganhar almas, a alegria era a adoração, o que os unia era a verdadeira comunhão, o amor era traduzido em ações, os fortes guiavam os fracos, as dificuldades eram enfrentadas com oração, a paz enchia os corações e todos, mesmo sem muita estrutura humana, possuíam como finalidade de vida apenas testemunhar do seu Mestre. Era uma Igreja visionária formada por gente limitada como nós.

Entretanto, quando olhamos para esta Ekklesia do Senhor Jesus no contexto embrionário do Novo Testamento a pergunta que salta aos olhos é: qual deve ser a principal motivação dos santos para o envolvimento com a obra missionária mundial fazendo Cristo conhecido entre todos os povos da terra? Nesta expectativa olhamos para Paulo o qual, como missiólogo, expôs aos Romanos a nossa real motivação bíblica e reformada.
Para isto é preciso reler Romanos 16:25-27 quando o apóstolo, encerrando esta carta de grande profundidade missiológica, diz:

"Ora, àquele que é poderoso para vos confirmar segundo o meu evangelho “
(fala de Deus)
"conforme a revelação do mistério "
(o mistério é o Messias prometido a todos os povos)
"e foi dado a conhecer por meio das Escrituras Proféticas"
(este é o meio de Revelação)
"segundo o mandamento do Deus eterno"
(este é o meio de Eleição)
"para a obediência por fé "
(este é o meio de Salvação)
"entre todas as nações "
(Isto é Missões – a extensão do plano salvífico de Deus)

Mas qual o motivo para este plano divino que visa a redenção de todos os povos?
Ele responde no verso 27: "Ao Deus único e sábio seja dada glória ...”

É a glória de Deus. Este é o maior e mais importante motivo para nos envolvermos com o propósito de fazer Jesus conhecido até a última fronteira do país mais distante, ou da criança caída na esquina da nossa rua.

Martinho Lutero, em um sermão expositivo em 1513 baseado no Salmo 91 afirmou que “a glória de Deus precede a glória da Igreja”. É momento de renovar nosso compromisso com as Escrituras, reconhecer que existimos como Igreja pela graça de Deus, orar ardentemente por fidelidade de vidas e entender que o próprio Jesus está construindo a Sua Igreja na terra. E quando colocarmos as mãos no arado, sem olhar para trás, nos lembremos: a razão da nossa existência é a glória do Deus. Pois Deus é maior do que nós.

Por Ronaldo Lindório

MEIOS CARNAIS x PESSOAS CARNAIS

A IGREJA USANDO MEIOS CARNAIS PARA ATRAIR PESSOAS CARNAIS



Uma verdade moderna!!!

A REFORMA PROTESTANTE

PERGUNTAS
E
RESPOSTAS

1. Qual a importância da Reforma?
A Reforma Protestante foi importante para o cristianismo porque chamou a atenção para verdades (doutrinas) e práticas bíblicas que haviam sido esquecidas ou distorcidas pela Igreja Medieval. Não foi um movimento inovador, mas restaurador das convicções e ênfases do cristianismo original. Algumas de suas principais contribuições foram: retorno às Escrituras; a centralidade de Cristo; a salvação vista como dádiva da graça de Deus, a ser recebida por meio da fé; a Igreja não é a instituição ou a hierarquia, mas o povo de Deus – cada cristão é um sacerdote.

2. A Reforma foi um movimento exclusivamente religioso?
Embora tenha sido um movimento predominantemente religioso, a Reforma teve importantes ligações com as realidades econômicas, políticas e sociais do século 16. Na área econômica, contribuíram para a Reforma fenômenos como o fim do feudalismo, o desenvolvimento do capitalismo e a crescente urbanização. Ao contrário da mentalidade católica medieval, os protestantes tinham uma visão positiva do trabalho, do lucro e das ocupações “seculares”. Suas concepções acerca da pobreza também eram diferentes. Por outro lado, a Reforma foi um protesto contra a opulência da Igreja Majoritária e suas contínuas interferências na economia das nações européias (através de inúmeros impostos eclesiásticos e outros meios).

3. Qual a posição de Lutero quanto ao livre arbítrio?
Lutero negou o livre arbítrio no que diz respeito à salvação – o ser humano, escravizado pelo pecado, não pode por si mesmo buscar a Deus. Todavia, o livre arbítrio permanece intacto em relação a outras questões, como as decisões comuns e as responsabilidades da vida cotidiana.

4. Por que existem tantas igrejas protestantes?
Lutero defendeu firmemente a sacerdócio universal dos fiéis, mas essa não é a principal razão da existência de muitas igrejas evangélicas. A razão maior está no princípio do “livre exame”, ou seja, o direito de todo cristão de estudar por si mesmo as Escrituras, não ficando preso à autoridade da Igreja ou a uma interpretação “oficial” da Bíblia.

5. Há necessidade de uma nova Reforma?
Existem muitas igrejas ditas “protestantes” ou “evangélicas” que, por terem se afastado dos princípios básicos propostos pelos reformadores, realmente necessitam de uma nova Reforma.

6. Como a Reforma contribuiu para o pensamento moderno?
A Reforma contribuiu para o pensamento moderno de muitas maneiras. Seu questionamento do autoritarismo religioso medieval, sua ênfase à participação responsável dos fiéis na vida e na direção das igrejas, seu estilo participativo de liderança, sua valorização do trabalho e de toda e qualquer ocupação honesta contribuíram para o fortalecimento de noções como liberdade, democracia e solidariedade social. Os diferentes reformadores e seus seguidores deram importantes contribuições nas áreas da teologia, filosofia, política, sociologia e ética.

7. Que dizer da imagem negativa de Lutero?
Felizmente, essa imagem negativa de Lutero está em declínio. Atualmente, mesmo historiadores católicos têm tido uma visão mais construtiva e equilibrada do pensamento e da obra do reformador.

8. É correta a interpretação de Marx e Engels de que a Reforma foi motivada por fatores sociais e econômicos?
Essa visão de Marx e Engels é parcial e inadequada. Lutero foi movido acima de tudo por sua intensa experiência religiosa. Ele havia se tornado um monge por preocupar-se com a sua salvação; porém, a sua vida monástica só fez aumentar a sua insegurança espiritual. Foi então que descobriu nas epístolas paulinas o ensino acerca da justificação pela fé. Essa experiência libertadora, que trouxe paz ao seu coração, e as convicções dela resultantes, foram o fundamento da sua obra como reformador.

9. Lutero era aliado das elites?
Lutero era inteiramente popular, como demonstram fartamente os seus escritos. Ele era um homem do povo, falava a linguagem do povo, por vezes bastante áspera, e só ocasionalmente envolveu-se com os nobres, por força das circunstâncias políticas da época.

10. É verdade que o reformador Lutero gostava de uma boa cerveja?
Lutero realmente gostava de comer e beber, por entender que essas eram dádivas de Deus aos seus filhos.

11. Por que a Reforma teve diferentes manifestações?
A Reforma teve características distintas em outras partes da Europa por vários motivos: as personalidades e ênfases dos outros reformadores, as peculiaridades culturais das outras nações e as realidades políticas dessas nações. Por exemplo, na Inglaterra a Reforma só implantou-se graças à interferência decisiva de vários monarcas, como Henrique VIII, Eduardo VI e, em especial, Elizabete I. Querendo agradar os seus súditos protestantes e católicos, ela criou o anglicanismo, uma síntese de elementos dessas duas tradições religiosas.

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TEOLOGIA DA CRUZ x TEOLOGIA DA GLÓRIA

Martinho Lutero:
A TEOLOGIA DA CRUZ EM CONTRASTE COM A TEOLOGIA DA GLÓRIA

A partir da cruz de Cristo, resulta uma inversão de todos os valores. Justamente o que é inferior no mundo, o que nada é, isto Deus escolheu. Para o judeu Saulo de Tarso, a cruz tinha sido uma grande pedra de tropeço. Afinal, Cristo crucificado é “escândalo para os judeus, loucura para os gentios” (1 Co 1.23). Porém, agora, para o apóstolo Paulo a “palavra da cruz é loucura para os que se perdem, mas para nós, que somos salvos, poder de Deus” (1 Co 1.18). Para ele, Cristo tornou-se “poder de Deus e sabedoria de Deus. Porque a loucura de Deus é mais sábia dos que os homens; e a fraqueza de Deus é mais forte do que os homens” (1 Co 1.24-25). Na cruz de Cristo, temos a redenção. Através de sua morte, temos a conciliação objetiva entre Deus e o homem. E na comunhão com Cristo entra somente quem participa de sua morte. “Nenhum personagem histórico entendeu melhor e mais profundamente o poder da cruz que Martinho Lutero, o reformador do século XVI”, escreve Mark Shaw.1 E Alister McGrath, um teólogo de Oxford, definiu a teologia da cruz de Lutero como “uma das compreensões mais poderosas e radicais da natureza da teologia cristã que a Igreja já conheceu”
Em abril de 1518, Martinho Lutero (1483-1546), em Heidelberg, contrapôs seus “Paradoxos” teológicos como “teologia da cruz” (theologia crucis) à “teologia da glória” (theologia gloriae), isto é, à teologia eclesial dominante. Este episódio de 1518 tem sido descrito por Shaw como um “sussurro silencioso e ignorado”; constitui-se, entretanto, um grande engano passar despercebido por ele. No “Debate de Heidelberg”, travou-se a discussão da indulgência. Lutero contrastou a teologia da cruz com a teologia oficial, diante de uma igreja que se tornara segura e saciada. Como exemplo dessa realidade, para financiar o seu projeto mais extravagante, a basílica de São Pedro em Roma (incluindo a Capela Sistina), Leão X (1475-1521), eleito papa em 1513, resgatou a prática de cobrar indulgências, o que, de alguma maneira, precipitou a Reforma Protestante. Em Heidelberg, distinguindo entre o cristianismo evangélico bíblico e as corrupções medievais, Lutero entendeu que a igreja medieval seguia o caminho da glória ao invés do caminho da cruz. Para Lutero a cruz é a marca de toda a teologia. “No Cristo crucificado é que estão a verdadeira teologia e o verdadeiro conhecimento de Deus.” Conhecer a Deus pela cruz é conhecer o nosso pecado e o amor redentor de Deus. Deus, na cruz, destrói todas as nossas idéias preconcebidas da glória divina. O perigo em potencial que a teologia da cruz vê na sua antítese é que a teologia da glória levará o homem a alguma forma de justiça pelas obras, à tendência de se fazer uma barganha com Deus com base em realizações pessoais. Por outro lado, a teologia da cruz repudia firmemente as realizações do próprio homem e deixa Deus fazer tudo para efetivar e preservar a sua salvação. Na doutrina de Martinho Lutero, a graça da justificação pela fé está rigorosamente orientada pelo Cristo crucificado.
Quem reconheceria que aquele que é visivelmente humilhado, tentado, condenado e morto é, internamente e ao mesmo tempo, sobremodo enaltecido, consolado, aceito e vivificado, não fosse o Espírito ensiná-lo pela fé? E quem admitiria que aquele que é visivelmente enaltecido, honrado, fortificado e vivificado é internamente rejeitado, desprezado, enfraquecido e morto de maneira tão miserável, se a sabedoria do Espírito não lhe ensinasse isso?

Quando a “sabedoria da cruz” não é entendida, também a Escritura permanece um livro trancado, pois a cruz de Cristo é a única chave para ela. A “sabedoria” humana se escandaliza com a Palavra de Deus e se irrita com a cruz de Cristo. Isto porque a nossa sabedoria está apaixonada por si própria, é como um doente que não quer que o médico o ajude. A nossa sabedoria é “sabedoria da carne”, que resiste à vontade de Deus. A cruz é o juízo daquilo que os homens se orgulham. A cruz é o juízo de toda glória humana, e a via crucis significa, por isso, desistir de toda glória humana. A cruz de Cristo contesta violentamente o senso natural. Para Lutero, a cruz de Cristo e a cruz do cristão são vistas em conjunto; a cruz de Cristo e a cruz do cristão formam uma unidade. O teólogo da cruz não está posicionado como espectador em relação à cruz de Cristo, ma ele próprio é envolvido neste acontecimento. Por isso, ele não foge dos sofrimentos, tal qual o teólogo da glória, mas considera-os tesouro valioso. Para Lutero, o teólogo da glória “define que o tesouro de Cristo são relaxações e isenções de penas, sendo estas as piores coisas e as mais dignas de ódio. O teólogo da cruz, pelo contrário, [afirma que] o tesouro de Cristo são imposições e obrigações de penas, sendo estas as melhores coisas e as mais dignas de amor”. Assim, para a teologia da cruz o sofrimento adquire significado todo especial. Os cristãos têm que se tornar iguais a seu Mestre em tudo e, por isto, têm de assumir a ignomínia de Cristo. Cristo nos precedeu no caminho que rejeita toda grandeza humana.

A glória do cristão consiste nesta “fraqueza e baixeza”. E sua baixeza se revela no ato de levar o sofrimento. Visto que em meio à vida de Cristo está erigida a cruz, a vida do cristão é discipulado e sofrimento. Uma razão, diz Lutero, pela qual as pessoas querem uma teologia da glória em vez de uma teologia da cruz é que elas “odeiam a cruz e o sofrimento”. Mas, à luz da cruz, o sofrimento serve a um propósito importante, a saber, a autonegação. Ela nos esvazia de nossa autoconfiança, para que possamos ter confiança em Deus. Contudo, o sofrimento jamais deve tornar-se “boa obra”, e não encontra sua origem em idéias ascéticas. A cruz do cristão está em unidade com a cruz de Cristo, e com isto está excluída por si só toda a idéia de mérito da pessoa, que pudesse ser obtido pelo sofrimento. Ao carregarmos nossa cruz, não fazemos com isso nada especial, mas simplesmente demonstramos que estamos em comunhão com Cristo. E também nem todo sofrimento pode reivindicar ser discipulado da cruz. Que significa isto: carregar a cruz de Cristo? “A cruz de Cristo outra coisa não é exceto o abandonar tudo e agarrar-se somente a Cristo pela fé do coração, ou seja: abandonar tudo e crer – isso é carregar a cruz de Cristo”.6 Assim, a cruz torna-se sinal da filiação divina. O padrão da cruz se torna o padrão de toda a jornada cristã. Lutero expressa este conceito ainda mais, nas seguintes palavras: Por isso somos ensinados aqui a crer contra a esperança na esperança; esta sabedoria da cruz está hoje por demais oculta em mistério. Também para o céu não há outro caminho do que esta cruz de Cristo. Por isso é preciso precaver-se, para que a vida ativa com suas obras, e a vida contemplativa com suas especulações não nos seduzam. Ambas são extremamente atrativas e tranqüilas, e por isso também perigosas, até que sejam temperadas pela cruz e perturbadas pelas adversidades. A cruz, no entanto, é de todas as coisas a mais segura. Bem-aventurado quem entende.

Em seu clímax, a vida sob a cruz se apresenta como “conformidade com Cristo”. Assim, conforme a teologia da cruz, a vida do cristão nada mais é do que “ser crucificado com Cristo”. O batismo não está apenas no começo da vida cristã, mas no ato do batismo temos o símbolo de toda a vida cristã: um constante morrer e ressuscitar com Cristo. “Ser crucificado com Cristo” realiza-se de dois modos: no interior da pessoa pela “mortificação” e no exterior pela inimizade do mundo. Porém, o conceito luterano do morrer do velho homem precisa ser traçado com base na doutrina da justificação. A mortificação não é obra meritória. Ela não é pré-requisito para a fé que alcança a graça, mas, inversamente, pressupõe a fé. Lutero, neste sentido, não se gloria na sua cruz, mas se gloria na graça de Deus. A teologia da cruz, em Lutero, se encontra na mais aguda oposição a qualquer moralismo.

De acordo com Lutero, ser crucificado com Cristo revela-se ainda no fato de um verdadeiro cristão ter de atrair necessariamente sobre si a inimizade do mundo. A inimizade do mundo é sinal para a autenticidade do discipulado. Pois o próprio evangelho é um escândalo para o mundo. A exemplo de Cristo, vestimos a “forma de servo”; renunciamos todo orgulho, fama e honra diante do mundo e de nós mesmos, e nos deixamos envolver na ignomínia de Cristo. Tornar- nos conformes com Cristo outra coisa não significa do que experimentar o fato da cruz também em nossa vida. Somos pessoas conformes com Cristo quando a cruz não permanece apenas um fato histórico, mas quando ela está erigida em meio à nossa vida. Isto, não obstante, é fruto da graça de Deus. A cruz é, portanto, um paradoxo:

Deus rejeita os orgulhosos, mas aos humildes concede a sua graça; ele rejeita os heróis, mas derrama o seu amor justificador aos fracassados. Assim, a humildade é a virtude básica da vida sob a cruz, do mesmo modo como a soberba é o verdadeiro e o maior pecado. Somente a fé pode perceber essa realidade verdadeira e paradoxal. A fé e a humildade estão intimamente relacionadas. A fé ensina a humildade, pois a fé é “negação de nós mesmos”, total renúncia e confiar na graça de Deus. Nesta negação de todos os direitos humanos, a fé se identifica com a humildade. Ostentar a própria humildade, como numa espiritualidade monástica, não é humildade. (...) ninguém se considera humilde ou se gloria de sê-lo, a não ser o que é o mais orgulhoso. Somente Deus reconhece a humildade, e também somente ele a julga e revela, de sorte que a pessoa jamais tem menos consciência da humildade do que justamente quando é humilde.
Por isso, a busca monástica por humildade não faz nenhum sentido. O caminho da humildade não vai de fora para dentro, mas de dentro para fora. Não podemos apresentar nossa humildade (“nulidade”) como mérito diante de Deus. Humildade é a renúncia consciente a todas as qualidades humanas com as quais poderíamos argumentar. Neste sentido, a humildade tem que preceder à fé, pertence ao alicerce crítico da fé. Justificação pela fé só poderá acontecer onde houver sido posto este alicerce. Neste sentido, humildade, tal como a fé, não é uma virtude. É a renúncia de toda virtude; é saber que não podemos subsistir perante Deus com nossa virtude. “Humildade nada mais é do que o auto-reconhecimento perfeito, que encerra a fé justificante.”9 Este conceito luterano de humildade não se compara em nada ao sentido católico-sinergista.

Todo sinergismo está excluído. Por conseguinte, Lutero conta a cruz e o sofrimento entre os sinais particulares da igreja (nota ecclesiae). Faz parte da natureza da igreja encontrar-se ela no sofrimento; uma igreja da qual não se pode afirmar isso é uma igreja que se tornou infiel à sua destinação. A Igreja pode ser seduzida pela teologia da glória e se transformar em uma religião de boas obras e análises dos desempenhos dos fiéis. Lutero usou, portanto, a idéia de uma forma sofredora da igreja criticamente contra o papado e para julgamento da história da igreja. O Cristo morto e ressurreto está trabalhando em meio à fraqueza da Igreja, preparando-a para mostrar a sua força. De modo similar, o Cristo morto e ressurreto “julga a Igreja onde ela se tornou orgulhosa e triunfante, ou segura e presunçosa, e a chama para voltar ao pé da cruz, onde lembra da maneira misteriosa e secreta que Deus trabalha no mundo”. A teologia da cruz conhece a Deus no próprio lugar onde Ele se ocultou – na cruz, com os seus sofrimentos, todos eles considerados fraqueza e loucura pela teologia da glória. Deus é conhecido e compreendido não na força, mas na fraqueza, não numa demonstração impressionante de majestade e poder, mas na exibição de um amor que se dispõe a sofrer a fim de converter o homem para si: “Sendo justificados gratuitamente, por sua graça, mediante a redenção que há em Cristo Jesus, a quem Deus propôs, no seu sangue, como propiciação, mediante a fé, para manifestar a sua justiça” (Rm 3.24-25). No momento em que a proclamação eclesial deixa de ser uma pedra de tropeço para o povo, isto é sinal de que ela traiu o evangelho. No escândalo, porém, é que está o “poder do evangelho”. A adoração ou pregação que faz as pessoas sentirem-se bem consigo mesmas, ou satisfeitas com suas palavras e pensamentos arrogantes sobre Deus, é uma adoração da glória que condena nossa alma e nos separa de Deus. Quando a igreja perde sua cruz, “trocando- a pelo aplauso desta era ou a medida de sucesso deste mundo, acaba se deparando com um futuro pouco promissor”, escreve Shaw.

A cruz de Cristo continua sendo ofensiva, como foi na época em que os primeiros cristãos começaram a falar dela como o caminho de Deus para a salvação. E nossa função, como a de João Batista, é apontar para Jesus Cristo crucificado – “Olhem o cordeiro de Deus!” E hoje, nesta era antropocêntrica e narcisista, a Igreja deve prosseguir dizendo ao homem: A si mesmo se negue, e dia a dia tome a sua cruz, e siga a Cristo.


Por: Gilson Santos
Fonte: Editora Fiel

sábado, 10 de novembro de 2012

A HISTÓRIA CAMINHA PARA A DESTRUIÇÃO DOS ALICÉRCES



Uma Palavra Realista!

O GRANDE PARADOXO DO CRISTIANISMO

FELIZ MESMO SENDO PERSEGUIDO

INTRODUÇÃO

Para nós é quase incompreensível associar perseguição com felicidade. Parece-nos coisas mutuamente exclusivas. Esse é um grande paradoxo. Mas Jesus termina as bem-aventuranças, dizendo-nos que o mais elevado grau de felicidade está ligado à perseguição.

Um aluno perguntou ao Rev. Francisco Leonardo: “Pastor, se a igreja for mais perseguida será mais fiel? Não, se for mais fiel, será mais perseguida”.

A nossa religião deve custar para nós as lágrimas do arrependimento e o sangue da perseguição, diz Thomas Watson. A cruz vem antes da coroa. O deserto precede a terra prometida, o sofrimento precede a glória. Importa-nos entrar no reino por meio de muitas tribulações.

1. O cristão é perseguido por quem ele é – O cristão é perseguido por quem ele é. Porque você é um cristão o mundo o odeia, como odiou a Cristo: “Se o mundo vos odeia, sabei que, primeiro do que a vós outros, me odiou a mim. Se vós fôsseis do mundo, o mundo amaria o que era seu; como, todavia, não sois do mundo, pelo contrário, dele vos escolhi, por isso, o mundo vos odeia” (Jo 15:18-19).

2. O cristão é perseguido por ser um pacificador – O espírito que reina neste mundo é contrário à paz. O espírito que atua nos filhos da desobediência é o mesmo que é mentiroso, ladrão e assassino.

I. A NATUREZA DA PERSEGUIÇÃO

O mundo ataca sua vida e sua honra. O mundo fere-o com a armas e com a língua. Procura destruir sua vida e também sua digniidade.

1. A perseguição da mão – v. 10

Ao longo dos séculos a igreja tem sofrido perseguição. Os crentes foram perseguidos em todos os lugares, em todos os tempos. Paulo disse: “Todo aquele que quiser viver piedosamente em Cristo será perseguido” (2 Tm 3:12). Depois de ser apedrejado em Listra Paulo encorajou os novos crentes, dizendo-lhes: “… através de muitas tribulações, nos importa entrar no Reino de Deus” (At 14:22). Escrevendo aos filipenses, Paulo disse: “Porque vos concedida a graça de padecerdes por Cristo e não somente de crerdes nele” (Fp 1:29).

2. A perseguição da língua – v. 11

O cristão é atacado não apenas pela oposição e pela espada do mundo, mas também, pela língua dos ímpios. A língua é como fogo e como veneno. Ela é uma espada desembanhada (Sl 55:21). Você pode matar uma pessoa tirando-lhe a vida ou destruindo-lhe o nome. Três são as formas dessa perseguição:

a) Injúria (v.11) – A palavra oneididzo jogar algo na cara de alguém, maltratar com palavra vis, cruéis e escarnecedoras. Cristo foi acusado de ser beberrão e endemoniado. Pesaram sobre os cristãos muitas coisas horrendas. Foram chamados de canibais, de imorais, de incendiários, de rebeldes, de ateus. Chamaram Paulo de tagarela, de impostor, de falso apóstolo.

b) Mentira (v.11) – A arma do diabo é a mentira. A mentira é a negação, ocultação e alteração da verdade. Chamaram Jesus de beberrão, de possesso, de filho ilegítimo. O cristão é abençoado por Deus e amaldiçoado pelo mundo.

c) Falar mal (v.11) – Os cristãos são alvos da maledicência. É a inimizade da serpente contra a semente sagrada.

II. A CAUSA DA PERSEGUIÇÃO

1. Por que um cristão não deve sofrer?

a) Um cristão não deve sofrer como malfeitor – O apóstolo Pedro disse: “Não sofra nenhum de vós como assassino, ou ladrão, ou malfeitor, ou como quem se intromete em negócios de outrem” (1 Pe 4:15). Hoje a igreja evangélica está sendo motivo de chacota pela sua falta de integridade. A igreja cresce, mas a vida dos crentes não muda. Ser crente hoje não é sinônimo de ser íntegro, verdadeiro. Multiplicam-se os escândalos daqueles que se dizem cristãos.

b) Um cristão não deve sofrer pelas suas próprias ofensas – Davi sofreu porque desobedeceu a Deus. Ele atraiu tragédia sobre a sua própria cabeça. O ladrão na cruz admitiu: “nós sofremos justamente…”. Muitas pessoas são como Saul, sofrem pelos problemas geradas por elas mesmas. Elas se lançam sobre sua própria espada. Elas tiram a sua própria vida.

c) Um cristão não deve sofrer para ganhar notoriedade – Paulo diz que ainda que um homem doasse todos os seus bens e entregasse seu corpo para ser queimado, isso nada valeria sem a motivação correta, que é o amor. Um homem pode sacrificar a própria vida para adquirir fama, mas isso nada vale aos olhos de Deus.

2. Quem são aqueles os perseguidos?

A perseguição no verso 10 é generalizada, enquanto no verso 11 é personalizada. Ambos os versos, porém, falam do mesmo grupo. Quem são? São os mesmos descritos nos versos 3 a 9: os humildes, os que choram, os mansos, os que têm fome e sede justiça, os misericordiosos, os limpos de coração, os pacificadores.

2 Tm 3:12: “Todo aquele que quiser viver piedosamente em Cristo, será perseguido”. André, irmão de Pedro foi amarrado na cruz para ter morte lenta. Pedro ficou preso 9 meses e depois foi crucificado de cabeça para baixo. Paulo foi decapitado por Nero. Tiago foi passado ao fio da espada. Mateus, Bartolomeu e Tomé foram martirizados. João foi deportado para a ilha de Patmos.

Os apóstolos se consideravam o lixo do mundo, a escória de todos. Hoje os crentes querem ser estrelas. Estamos fabricando celebridades tão rápido como o mundo. Hoje os crentes gostam do sucesso, das coisas espetaculares. Hoje, as pessoas apresentariam Paulo assim: Formado na Universidade de Gamaliel, poliglota, amigo pessoal de muitos reis, maior plantador de igrejas do mundo, maior evangelista do século, dado por morto, arrebatado ao céu. Mas quais as credenciais que Paulo dá si mesmo? Leia 2 Coríntios 11:23-27: “…”.

3. Quando sofrer é uma bem-aventurança?

a) Quando sofremos por causa da justiça (v.10) – Alguns tomam a iniciativa de opôr-se a nós não por causa dos nossos erros, mas porque não gostam da justiça da qual temos fome e sede. A perseguição é simplesmente o conflito entre dois sistemas de valores irreconciliáveis. Sofrer pelo erro é não é bem-aventurança, mas vergonha e derrota. Sofrer pelo erro é punição e castigo e não felicidade. Sofrer porque foi flagrado no erro não é ser bem-aventurado. Um aluno não é feliz quando flagrado na prática da cola recebe um zero. Um funcionário não é feliz ao ser mandado embora por negligência. Um cristão não é feliz ao ser perseguido por ter violado a lei. Os crentes sofriam financeiramente por não participarem dos sindicatos comerciais que tinham suas dividandades padroeiros. Os crentes sofriam porque quando se convertiam eram desprezados pelos outros membros da família.

b) Quando sofremos por causa de nosso relacionamento com Cristo (v.11) – O mundo não odeia o cristão, mas odeia a justiça, odeia a Cristo nele. Não é a nós que o mundo odeia, mas a verdade que representamos. O mundo está atrás de Cristo, é a ele que o mundo ainda está tentando matar. O mundo odiou Jesus e o levou à cruz. Assim, quando o mundo vê Cristo em sua vida, em suas atitudes, o mundo também o odiará. Às vezes, essa perseguição promovida pela língua não procede apenas do mundo pagão, mas dos próprios religiosos: Jesus foi mais duramente perseguido pelos fariseus, escribas e sacerdotes. A religião apóstata tornar-se o braço do anticristo.

b.1) Perseguição na igreja primitiva

A igreja primitiva foi implacavelmente perseguida. Eles foram expulsos de Jerusalém. Eles foram espalhados pelo mundo. Nero iniciou uma sangrenta perseguição. Alguns eram jogados aos leões. Outros eram queimados na fogueira. Os crentes eram untados com resina e depois incendiados vivos para iluminar os jardins de Roma. Alguns crentes eram enrolados em peles de animais para os cães de caça morderem.

Os crentes eram torturados, esfolados, chumbo fundido era derramado sobre eles. Placas de latão em brasa era fixadas nas partes mais frágeis do corpo. Partes do corpo eram cortadas e assadas diante dos seus olhos.

O império tinha uma grande preocupação com sua unificação. Roma era adorada como deusa. Depois o imperador passou a personificar Roma. Os imperadores passaram a ser chamados: Senhor e Deus. O culto ao imperador passou a ser o grande elo da unificação política de Roma. Era obrigatório uma vez por ano todos os súditos do império queimarem incenso ao deus imperador num templo romano. Todos deviam dizer: “César é o Senhor”. Mas o cristãos se recusavam e eram considerados revolucionários, traidores e ilegais. Por isso eram presos, torturados e mortos.

b.2) Perseguições religiosas ao longo dos séculos

Os crentes foram perseguidos pela intolerância e inquisição religiosa. Alguns pré-reformadores foram queimados vivos como John Huss e Jerônimo Savonarola. John Wicliff precisou se esconder. Lutero ficou trancado num mosteiro. William Tindayle foi esquartejado. Depois da Reforma, na França Catarina de Médicis promoveu dura perseguição aos crentes. Na Inglaterra, Maria Tudor levou à estaca os líderes e passou ao fio da espada milhares de crentes. O comunismo ateu e o nazismo nacionlista levou milhões de crentes ao martírio. Na Coréia, na China e ainda hoje nos países comunistas e Islâmicos os crentes são presos, torturados e mortos.

III. A FORMA COMO DEVEMOS ENFRENTAR ESSA PERSEGUIÇÃO

1. Com uma profunda alegria

Não devemos buscar a vingança como o incrédulo; não ficar de mau humor como uma criança embirrada, nem ficar lambendo nossa própria ferida cheios de auto-piedade, nem negar a dor como um estóico, nem muito menos gostar de sofrer como um masoquista.

As palavras que Jesus usa descrevem uma alegria intensa, maiúscula, superlativa, absoluta. A palavra “exultai” agalliasthe significa saltar, pular, gritar de alegria. É alguém que pula de alegria, que exulta com alegria indizível e cheia de glória.

O cristão não é um masoquista – ele não tem prazer de sofrer. Ele não se alegra pela perseguição em si ou pelo próprio mal que está recebendo.

O cristão exulta pelo significado dessa perseguição e pelas recompensas dela.

2. Com uma paciência triunfadora

Os profetas sofreram e jamais se exasperaram. Jamais buscaram vingança. Jamais feriram aqueles que lhes feria a face. Eles se entregaram a Deus. Eles triunfaram pela paciência. Eles confiaram que Deus estava no controle, mesmo quando o mal paracia triunfar.

Exemplo: 1) A perseguição de Maria Tudor na Inglaterra em 1553-1558.

A perseguição aos crentes coreanos.

3. Com um profundo discernimento espiritual

A perseguição é a pedra de esquina da sinceridade. Ela distingue o verdadeiro crente do hipócrita. O hipócrita floresce na prosperidade, mas é sufocado pela perseguição (Mt 13:20,21). Um hipócrita não consegue navegar em mares tempestuosos. Ele irá seguir a Cristo ao Monte das Oliveiras, mas não ao Monte do Calvário.

O verdadeiro crente carrega Cristo no coração e a cruz nos ombros. Cristo e sua cruz jamais podem ser separados. Jesus disse que no mundo teríamos aflições (Jo 16:33).

IV. A RECOMPENSA DIVINA DA PERSEGUIÇÃO

1. Uma felicidade superlativa – v. 10,11

A palavra Macarioi descreve uma felicidade plena, copiosa, superlativa, eterna. Essa felicidade não é circunstancial. Ela não depende do que acontece à nossa volta. Ela vem do alto. Está dentro de nós.

Vejamos o que Tiago diz para o povo perseguido na diáspora: Tg 1:2-4: “Meus irmãos, tende por motivo de toda a alegria, o passardes por várias provações…”.

Jesus parabeniza aqueles que o mundo mais despreza, e chama de bem-aventurados aqueles que o mundo rejeita.

Por que os perseguidos são felizes?

a) Oportunidade para demonstrar lealdade a Cristo – Policarpo, o bispo de Esmirna. Ofereceram a ele a oportunidade de negar a Cristo e adorar a César: “Durante 86 anos tenho servido a Cristo, e ele nunca me fez mal. Como posso agora, blasfemar de meu Rei e Senhor?”

b) Porque contribuem com o bem daqueles que vêm depois de nós – Hoje desfrutamos liberdade e paz porque homens e mulheres do passado sofreram e pagaram um preço. Exemplo: a abolição da escravatura, a luta contra o preconceito e o crime contra o racismo.

2. A posse de um reino glorioso – v. 10

Essa última bem-aventurança termina como começou a primeira. Os perseguidos por causa da justiça recebem o reino dos céus. Aqui eles podem perder os bens, o nome e a vida, mas eles recebem um reino eterno, glorioso para sempre. Os sofrimentos do tempo presente não são para comparar com as glórias por vir a serem reveladas em nós (Rm 8:18).

Os perseguidos podem ser jogados numa prisão, podem ser torturados, podem ser martirizados, mas eles recebem uma herança incorruptível, gloriosa. Eles são filhos e herdeiros. Eles um dia ouvirão Jesus lhes dizer: “Vinde benditos de meu Pai, entrai na posse do Reino que vos está preparado desde a fundação do mundo”.

3. A certeza de que a recompensa final não é nesta vida – v. 12

O mundo odeia pensar no futuro. O ímpio detesta pensar na eternidade. Ele tem medo de pensar na morte, mas o cristão sabe que sua recompensa está no futuro. Ele olha para frente e sabe que tem o céu. Sabe que tem a coroa. Disse Paulo, na ante-sala do martírio: “Eu sei que o tempo da minha partida é chegada [...]. Agora a coroa da justiça me está preparada…” (2 Tm 4:6-8). Sabe que lhe espera um grande galardão. Podemos perder tudo aqui na terra, mas herdaremos tudo nos céus. Hebreus 11:10 diz que aguardamos a cidade celestial.

Crisóstomo, um grande cristão foi preso e chamado diante do imperador Arcadius por pregar a Palavra. Ameaçou baní-lo. Ele disse: Majestade, não podes me banir, pois o mundo é a casa do meu Pai. Então, terei de matá-lo. Não podes, pois minha vida está guardada com Cristo em Deus. Seus bens serão confiscados. Majestade isso não será possível. Meus tesouros estão nos céus. Eu te afastarei dos homens e não terás amigos. Isso não podes fazer, porque tenho um amigo nos céus que disse: “De maneira alguma te deixarei, jamais o abandonarei”.

4. A convicção de que é seguidor de uma bendita estirpe – v. 12

Quando você estiver sendo perseguido por causa da justiça e por causa de Cristo, saiba que você não está sozinho nesta arena, nesta fornalha, neste campo juncado de espinhos. Atrás de você marchou um glorioso exército de profetas de Deus. A perseguição é um sinal de genuinidade, um certificado de autenticidade cristã, “pois assim perseguiram os profetas que viveram antes de vós”. Se somos perseguidos hoje pertencemos a uma nobre sucessão. Os ferimentos são como que medalhas de honra para o cristão. Jesus disse: “Ai de vós quando todos vos louvarem” (Lc 6:26).

Dietrich Bonhoeffer executado no campo de concentração nazista de Flossenburg por ordem de Heinrich Himmler, em abril de 1945, disse que o sofrimento é uma das características dos seguidores de Cristo.

Isso prova que você verdadeiro é uma pessoa salva. Isso prova que verdadeiramente você está acompanhado por uma nuvem de testemunhas da mais alta estirpe espiritual. Quando você é perseguido, isso significa que você pertence à linhagem dos profetas.

CONCLUSÃO

Vejamos finalmente algumas considerações finais sobre essa bem-aventurança:

1. Precisamos considerar por quem sofremos?

Muitas pessoas sofrem por seus pecados, por sua luxúria, por seus prazeres, por seus bens materiais. Não deveríamos nós ter disposição para sofrer por Cristo? Se um homem é capaz de sofrer pelos seus pecados que o levam a morte, não deveríamos nós sofrer por Cristo que nos deu a vida?

2. Precisamos considerar que sofrer por Cristo é uma honra

Os apóstolos depois de serem açoitados pelo sinédrio, saíram regozijando por terem sido considerados dignos de sofrer afrontas por causa de Cristo (At 5:41). Os discípulos aspiravam um reino temporal (At 1:6), mas Cristo lhes disse que eles seriam mártires a levarem seu testemunho até aos confins da terra. Sofrer por Cristo é mais honroso do que ter um reino sobre a terra.

3. Precisamos considerar o que Cristo suportou por nós

Toda a vida de Cristo foi uma vida de sofrimento.

a) Você é pobre? Também Cristo foi. Ele não tinha onde reclinar a cabeça.

b) Você está cercado de inimigos? Também Cristo esteve. Pedro disse: “Porque verdadeiramente se ajuntaram nesta cidade contra o teu santo servo Jesus, ao qual ungiste, Herodes e Pôncio Pilatos, com gentios e gente de Israel” (At 4:27).

c) Você tem sido traído pelos amigos? Também Cristo foi. “Judas tu trais o filho do homem com um beijo?” (Lc 22:48).

d) Você tem sido acusado injustamente? Também Cristo o foi: Acusaram Jesus de insurgir contra a lei, contra o templo, contra César. Acusaram-no de expulsar demônios pelo poder de Belzebu.

e) Você tem sido ultrajado com escárnio – Também Jesus o foi. Foi preso, espancado, cuspido, pregado na cruz.

4. Precisamos considerar que o nosso sofrimento aqui é leve e momentâneo quando visto à luz da recompensa eterna

Paulo diz que a nossa leve e montânea tribulação produz para nós eterno peso de glória. Somos bem-aventurados!

5. Precisamos ter a convicção que a perseguição e o sofrimento jamais poderão nos separar do amor de Deus

Paulo proclama em Romanos 8:35-39: “Quem nos separará do amor de Cristo, será tribulação…?”.

Por
Rev. Hernandes Dias Lopes
PALAVRA DA VERDADE

EM 100 ANOS VOCÊ ESTARÁ MORTO



Que o Senhor da eternidade tenha misericórdia de nós!

PREGAR A VERDADE

SEM FALSIFICAR A PALAVRA

Por J. C. Ryle.

"Ao contrário de muitos, não negociamos a palavra de Deus visando lucro; antes, em Cristo falamos diante de Deus com sinceridade, como homens enviados por Deus" (2Coríntios 2.17, NVI).

Não é pouca coisa falar a uma congregação de almas imortais sobre as coisas de Deus. Mas a responsabilidade mais importante de todas é falar a um grupo de ministros do Evangelho como o que vejo diante de mim neste momento. Atravessa-me a mente a terrível sensação de que uma só palavra equivocada que possa arraigar-se em algum coração frutifique e no futuro, desde algum púlpito, possa causar danos cujo alcance desconhecemos.

Mas há ocasiões em que a verdadeira humildade pode ser vista não tanto nas confissões em voz alta de nossa fraqueza, mas sim quando esquecemos verdadeiramente de nós mesmos. Desejo, portanto, esquecer meu ego nesta ocasião ao dirigir minha atenção a esta passagem das Escrituras. Se não digo muita coisa sobre meu sentimento de insuficiência, creia que não é porque não o tenha.

A expressão grega traduzida como "negociamos" deriva de uma palavra cuja etimologia não encontra consenso entre os lexicógrafos. Refere-se ou a um comerciante que não leva seu negócio honradamente ou a um produtor de vinhos que adultera o vinho que põe à venda. Tyndale a traduz como: "Não somos como aqueles que mutilam e modificam a Palavra de Deus". Na versão Rhemish lemos: "Não somos como muitos, que adulteram a Palavra de Deus". Na Versão Autorizada inglesa, numa nota à margem, lemos: "Não somos como muitos, que utilizam com engano a Palavra de Deus".

Na construção dessa frase, o Espírito Santo inspirou Paulo para que declarasse a verdade de forma negativa e positiva. Esse tipo de construção adiciona claridade ao sentido das palavras e as torna inequívocas, além de intensificar e fortalecer a asseveração nelas contida. Dão-se casos de construções similares em outras três extraordinárias passagens bíblicas, duas em referência ao batismo e uma com respeito à questão do novo nascimento (cf. Jo 1.13; 1Pe 1.23; 3.21). Percebemos, portanto, que nosso texto contém lições tanto positivas quanto negativas para a instrução dos ministros de Cristo. Umas coisas devem ser evitadas. Outras, devem ser procuradas.

A primeira lição negativa é uma clara advertência contra a falsificação ou a utilização enganosa ou "comercial" da Palavra de Deus. O Apóstolo diz que "muitos" procedem dessa forma, assinalando que mesmo em sua época havia alguns que não tratavam a verdade de Deus com honra e fidelidade. Aqui temos uma resposta contundente àqueles que afirma que a "igreja primitiva" era de uma pureza exemplar. O mistério da iniquidade já estava operando. A lição é que devemos evitar qualquer asseveração falsa com respeito à Palavra de Deus, a qual fomos encarregados de pregar. Não devemos acrescentar-lhe nada. Não devemos tirar-lhe nada.

Muito bem, quando pode-se dizer que estamos falsificando a Palavra de Deus na atualidade? Quais são os recifes e os bancos de areia que devemos evitar se não quisermos fazer parte dos "muitos" que manipulam enganosamente a verdade de Deus? Algumas indicações a esse respeito podem ser mui úteis.

Falsificamos a Palavra de Deus da forma mais perigosa quando lançamos qualquer sombra de dúvida sobre a inspiração plena das Sagradas Escrituras. Isso não é meramente corromper o vaso, mas sim contaminar toda a fonte. Isso não é meramente poluir o cântaro, mas sim envenenar todo o poço. Uma vez enganados neste ponto, toda a essência de nossa religião estará em perigo. É uma fissura no fundamento. É um verme devorador na raiz de nossa teologia. Uma vez que permitirmos que esse verme ataque a raiz, logo o tronco, os galhos e as folhas começarão a decair pouco a pouco. Sou bem consciente de que a questão da inspiração está rodeada de certas dificuldades. Mas em minha humilde opinião, apesar de certas questões que não podemos resolver agora, a única postura adequada e segura que podemos adotar é esta: que cada capítulo, cada versículo e cada palavra da Bíblia são inspirados por Deus. Jamais deveríamos abandonar nenhum princípio teológico, como também não abandonamos os princípios científicos devido a aparentes dificuldades que não podemos eliminar na atualidade.

Permitam-me mencionar uma analogia sobre esse importante axioma. Aqueles que estão familiarizados com a astronomia sabem que antes do descobrimento de Netuno havia dificuldades que preocupavam muito a maioria dos astrônomos a respeito de aberrações na órbita do planeta Urano. Essas aberrações confundiam as mentes dos cientistas e alguns deles indicaram que poderia ser demonstrado, por meio delas, que o sistema newtoniano não era correto. Mas, naquela época, um conhecido astrônomo francês chamado Leverrier leu, ante a Academia de Ciências, um artigo no qual estabelecia o grande axioma segundo o qual não seria apropriado renunciar a um princípio científico por causa de algumas dificuldades que não podiam, no momento, ser explicadas. Ele disse: "Não podemos explicar as alterações da órbita de Urano por enquanto. Mas estamos certos de que mais cedo ou mais tarde demonstraremos que o sistema newtoniano está correto. Talvez alguém descubra algo um dia que prove que essas alterações orbitais de Urano são perfeitamente explicáveis, sem descartar o sistema de Newton". Alguns anos depois, os angustiados olhos dos astrônomos descobriram, finalmente, o último grande planeta: Netuno. E foi comprovado que as alterações na órbita de Urano eram causadas pela presença de Netuno, e que o astrônomo francês havia estabelecido um princípio científico sábio e correto: afinal, Newton continuava certo. A aplicação desta história é óbvia.

Tenhamos o cuidado de não renunciar a nenhum princípio teológico básico. Não renunciemos ao grande princípio da inspiração plena das Escrituras por causa de algumas dificuldades que possam surgir diante de nós. Chegará o dia em que tais dificuldades serão resolvidas. Enquanto isso, podemos estar certos de que as dificuldades que enfrentam quaisquer outras teorias da inspiração são muito maiores do que as que nós enfrentamos.

Em segundo lugar, falsificamos a Palavra de Deus quando fazemos afirmações doutrinárias equivocadas. Fazemos isso ao acrescentar à Bíblia as opiniões da Igreja ou de "Pais" da Igreja como se tivessem a mesma autoridade das Escrituras. Fazemos isso quando subtraímos coisas da Bíblia a fim de agradar aos homens ou quando, por um sentimento de falsa liberalidade, evitamos qualquer afirmação bíblica que possa parecer radical, dura ou estreita. Falsificamos a Palavra de Deus quando tentamos suavizar qualquer coisa que se ensine com respeito ao castigo eterno ou à realidade do inferno. Fazemos isso quando elevamos certas doutrinas a alturas desproporcionais. Todos temos doutrinas favoritas e nossas mentes estão constituídas de tal forma que é difícil ver claramente uma verdade sem esquecer que existem outras verdades igualmente importantes. Não devemos esquecer a exortação paulina de ministrar "de acordo com a medida da fé". Falsificamos a Palavra de Deus quando exibimos um desejo excessivo de encobrir, defender ou maquiar doutrinas como a da justificação pela fé sem as obras da Lei por medo da acusação de antinomismo; ou quando fugimos de afirmações sobre a santidade e a santificação por medo de sermos considerados legalistas. Falsificamos a Palavra de Deus quando evitamos utilizar a linguagem bíblica ao mencionar as doutrinas. Temos a tendência de evitar termos como "novo nascimento", "eleição", "adoção", "conversão", "segurança" e substituí-los por expressões inócuas, como se tivéssemos vergonha da linguagem clara e direta da Bíblia.

Em terceiro lugar, falsificamos a Palavra de Deus quando a aplicamos de forma equivocada. O fazemos ao não discernir os diferentes tipos de pessoas em nossas congregações, quando nos dirigimos a todos como se fossem salvos em razão de seu batismo ou de sua associação com a Igreja e não traçamos uma linha entre os que têm o Espírito e os que não O têm. Não somos propensos a deixar de lado os chamados claros aos não convertidos? Quando temos 800 ou 2000 pessoas diante de nosso púlpito e sabemos que uma grande parte delas não é salva, não corremos o risco de manejar defeituosamente a Palavra de Deus em nossas exortações práticas, ao não deixar suficientemente claro o que a Bíblia diz aos diversos tipos de pessoas que formam a nossa congregação? Falamos claramente aos pobres, mas falamos claramente também aos ricos? Falamos claramente ao nos dirigir às classes altas? Este é um ponto respeito ao qual temo que necessitamos examinar nossas consciências.


Passemos agora às lições positivas do nosso texto: "antes, em Cristo falamos diante de Deus com sinceridade, como homens enviados por Deus".


Deveríamos ter o propósito de falar "com sinceridade" - sinceridade de propósito, de coração e de motivações - e de falar como quem está profundamente convencido da verdade que proclama, como quem possui fortes sentimentos e um terno amor por aqueles a quem se dirige.


Deveríamos ter o propósito de falar "como homens enviados por Deus". Deveríamos nos esforçar para nos sentir como homens que foram encarregados de falar em nome de Deus e em Seu lugar. Em nosso pavor de cair no romanismo, frequentemente esquecemos as palavras do Apóstolo: "Honro o meu ministério". Esquecemos quão grande é a responsabilidade do ministro do Novo Pacto e quão terrível é o pecado daqueles que, quando um verdadeiro ministro de Cristo se dirige a eles, recusam-se a receber a sua mensagem e endurecem seus corações.


Deveríamos ter o propósito de falar "diante de Deus". Não devemos perguntar a nós mesmos o que as pessoas pensam de nós, mas o que Deus pensa de nós. Latimer recebeu, em certa ocasião, o chamado para pregar diante de Henrique VIII e começou seu sermão da seguinte forma: "Latimer! Latimer! Lembre-se de que você está falando diante do excelso e poderoso rei Henrique VIII; diante daquele que tem poder para enviá-lo à prisão, diante daquele que tem poder para ordenar que você, Latimer, seja decapitado. Latimer, tenha cuidado para não dizer nada que ofenda os ouvidos reais!". Então, depois de uma pausa, Latimer prosseguiu: "Latimer! Latimer! Lembre-se de que você está falando diante do Rei dos Reis e do Senhor dos Senhores, diante d'Aquele perante quem o próprio rei Henrique VIII deverá apresentar-se um dia; diante d'Aquele que você mesmo deverá prestar contas um dia! Latimer, seja fiel ao Senhor e proclame toda a Palavra de Deus!". Oh! Que seja este o espírito com que nos retiramos de nossos púlpitos: não preocupados pensando se os homens ficaram satisfeitos ou insatisfeitos, nem se estarão nos elogiando ou nos difamando; mas preocupados, sim, com o testemunho de nossa consciência de que temos falado diante de Deus.


Por último, deveríamos ter o propósito de falar "em Cristo". O significado dessa expressão não está claro. Grotius diz o seguinte: "Devemos falar em Seu nome, como embaixadores de Cristo". Mas Grotius tem pouca autoridade. Beza diz: "Devemos falar sobre Cristo, a respeito de Cristo". Isso é boa doutrina, mas dificilmente representa o significado exato dessas palavras. Outros dizem: devemos falar como unidos a Cristo, como aqueles que receberam a misericórdia de Cristo e cujo único direito de dirigir-se aos demais provém de Cristo. Outros dizem: devemos falar através de Cristo, com a força de Cristo. Talvez esse seja o melhor sentido. A expressão no grego corresponde à de Filipenses 4.13: "Tudo posso naquele que me fortalece". Seja qual for o significado que atribuímos a essas palavras, uma coisa é bem clara: devemos falar em Cristo, como quem recebeu misericórdia; como quem não deseja exaltar-se a si mesmo, senão ao Salvador; como quem não se preocupa com o que os homens possam dizer, mas somente com que Cristo seja glorificado e magnificado em seu ministério.


Em resumo, todos deveríamos nos perguntar: Alguma vez manipulamos enganosamente a Palavra de Deus? Compreendemos o que é falar da parte de Deus, diante de Deus e de Cristo? Permitam-me fazer-lhes perguntas diretas. Há algum texto na Palavra de Deus que não conseguimos expor? Há alguma afirmação na Bíblia que evitamos falar à nossa congregação não porque não a entendemos, mas porque contradiz alguma ideia que temos a respeito da Verdade? Se é assim, perguntemos a nossas consciências se estamos manipulando enganosamente a Palavra de Deus.


Há algo na Bíblia que estamos deixando de lado porque tememos parecer duros e ofender parte de nossa audiência? Há alguma afirmação, seja doutrinária ou prática, que mutilamos ou desmembramos ou escondemos? Se é assim, estaremos tratando com a Palavra de Deus com a honra devida?


Oremos para que sejamos guardados de falsificar a Palavra de Deus. Que nem o temor ao homem nem o favor dos homens nos induzam a rejeitar, evitar, mudar, mutilar ou maquiar texto algum da Bíblia. Sem dúvida, quando falamos como embaixadores de Deus, devemos fazê-lo com santa ousadia. Não temos motivo algum para nos envergonhar de qualquer afirmação que façamos desde nossos púlpitos sempre que esteja de conformidade com as Escrituras. Com frequência tenho pensado que um dos grandes segredos da maravilhosa honra que Deus tem colocado sobre um homem que não pertence à nossa denominação (refiro-me ao Sr. Spurgeon) é a extraordinária coragem e confiança com que ele fala no púlpito às pessoas a respeito de seus pecados e do estado de suas almas. Não se pode dizer que ele o faça com medo de alguém ou para contentar alguém. Parece dar o que corresponde a todo tipo de ouvinte: ao rico e ao pobre, ao nobre e ao camponês, ao erudito e ao analfabeto. Trata a cada um com claridade, segundo a Palavra de Deus. Creio que essa mesma coragem tem muito a ver com o sucesso que Deus tem dado ao seu ministério. Não nos envergonhemos de aprender uma lição dele nesse aspecto. Vamos aos nossos púlpitos e façamos o mesmo.

John Charles Ryle (1816-1900), "um homem de granito, com o coração de uma criança", foi o primeiro bispo de Liverpool, escritor prolífico e defensor do caráter protestante da Igreja da Inglaterra. Mais de 100 anos depois de sua morte, seus sermões e escritos ainda falam poderosamente aos cristãos de hoje. O sermão acima foi pregado em Weston-super-Mare, em agosto de 1858, por ocasião do Aggregate Clerical Meeting, sob a presidência do arquidiácono Law, registrado em notas taquigráficas por um dos ouvintes e mais tarde redigido em língua inglesa para publicação.

Fonte: RYLE, J. C. Advertencias a las Iglesias. Moral de Calatrava (Ciudad Real): Peregrino, 2003, pp. 28-35.

Traduzido do espanhol por F.V.

quinta-feira, 8 de novembro de 2012

A GRAÇA INCOMUM

SALMO 1 E 2 SOBRE GRAÇA

Nas quatro últimas edições do News, consideramos cinco Salmos (5, 11, 69, 73 e 92) que se opõem à falsa doutrina da graça comum. Mas os Salmos têm muito mais a dizer em defesa da graça soberana, particular e incomum de Deus. Dada a importância desse assunto e o interesse e apoio considerável dos nossos leitores – alguns inclusive mencionando Salmos específicos que desejariam que fossem incluídos – proponho lidar com mais Salmos, começando com o primeiro e o segundo.

A primeira palavra do Salmo 1, tanto em hebraico como em português, é “bem-aventurado”, uma palavra-chave no debate sobre graça comum. Um homem “bem-aventurado” (Sl 1.1) é alguém bendito e tornado feliz pelo fato de Deus o ter trazido à comunhão viva com ele mesmo. Que Deus nos abençoa significa que ele tem uma atitude favorável de graça e de misericórdia para conosco, que ele interna e graciosamente restringe o pecado em nós e que ele nos capacita a fazer boas obras que são agradáveis aos seus olhos por meio de Jesus Cristo. O caminho da bem-aventurança e da felicidade para nós como povo de Deus é aquele da prática da antítese, a separação espiritual dos ímpios – nenhum “andar”, “deter-se”, “assentar” em comunhão com eles (1). O versículo 1 é contrário à noção de muitos defensores da graça comum, os quais afirmam que os crentes devem ser amigos dos incrédulos e deveriam cooperar com os “não cristãos de boa vontade” na construção do reino de Deus sobre a Terra. Embora o versículo 1 declare, negativamente, o que o homem bem-aventurado não faz, o versículo 2 apresenta, positivamente, seu deleite e meditação na Palavra de Deus. Ao evitar o ímpio (1) e banquetear-se com as Sagradas Escrituras (2), o santo fiel é comparado a uma árvore bem regada e frutífera (3).

A segunda metade do primeiro Salmo volta-se para os ímpios (4-6), começando com a declaração simples e devastadora: “Não são assim os ímpios” (4). Contrário ao povo de Deus (1-2), os não convertidos reúnem-se em seu pecado e desprezo pela Palavra de Deus. Enquanto o homem piedoso é “bem-aventurado” (1), “não são assim os ímpios” (4). A atitude de Deus para com eles não é de amor e favor, mas de ira. Jeová não opera graciosamente neles para refrear o pecado e tornar suas obras parcialmente justas aos seus olhos. Eles não produzem nenhum “fruto” bom e não “prosperam” espiritualmente (3). Não existe nenhuma graça comum aqui!

O Salmo 1.6 observa que “o SENHOR conhece o caminho dos justos; porém o caminho dos ímpios perecerá”. Obviamente, o Deus onisciente “conhece” os caminhos dos crentes e dos incrédulos, se “conhece” aqui simplesmente significa “estar intelectualmente ciente”. Esse texto está dizendo, portanto, que Jeová “conhece [com o conhecimento íntimo de amor]” o “caminho” (i.e., estilo de vida, comportamento) dos seus santos. O paralelismo hebraico do Salmo 1.6 nos ensina que Deus não “conhece” (i.e., ama) o “caminho” (i.e., estilo de vida, comportamento) dos ímpios; ele odeia o “caminho” deles porque os réprobos são totalmente depravados, assim como todas as suas obras (Pv 6.16-19; Rm 3.10-18). Dessa forma, não somente os ímpios serão condenados no grande dia do juízo (Sl 1.5) e lançados como a palha perante o vento (4), mas Deus detesta tanto o comportamento e estilo de vida deles que até mesmo “o caminho dos ímpios perecerá” (6)!

O Salmo 2 fornece uma excelente refutação da graça comum e do que ela é supostamente capaz de fazer. Os “pagãos” (KJV), os “povos”, os “reis da terra” e os “governos” (1-2) são os judeus, os gentios e seus líderes, Herodes e Pôncio Pilatos, de acordo com Atos 4.25-28.

De acordo com a teoria da graça comum, o império romano e as pessoas com domínio terreno, supremacia militar, prosperidade material, estradas excelentes, jurisprudência desenvolvida e alto nível de civilização foram grandemente abençoadas por Deus. Enquanto os romanos pagãos tinham a graça comum mais politicamente, os judeus incrédulos tinham supostamente a graça comum mais religiosamente (por meio de sua possessão externa da lei e da descendência física de Abraão, etc.).

Mas o que os romanos e judeus ímpios fizeram com todo esse suposto amor de Deus por eles, para eles, sobre eles e neles? O Salmo 2 diz que eles atacaram Jeová e o “seu ungido” (2) ou Messias (do hebraico) ou Cristo (do grego) e pregaram o Filho encarnado de Deus na cruz! Esses supostos promotores da “lei natural” (os romanos) e da lei do Antigo Testamento (os judeus) rejeitaram a lei de Deus e romperam suas “ataduras” e “cordas” (3). Quantas boas obras produzidas pela graça comum!

Será que esses judeus e gentios ímpios frustraram o propósito divino de salvar o seu povo e exaltar o seu Filho? Não! “Eu, porém, ungi o meu Rei sobre o meu santo monte de Sião” (6). Existe algum amor divino por esses incrédulos que receberam tantas coisas boas na providência (não graça) de Deus? Não! O Senhor ri e zomba deles (4). Ele não abençoa ou fala bem deles ou a eles; ele lhes fala “em sua ira” (5). De forma alguma ele está satisfeito com eles ou com suas obras; ele os turba “no seu furor” (5).

A crucificação de Cristo foi seguida por sua ressurreição (7; Atos 13.33) e ascensão à mão direita de Deus (Sl 2.6) e governo sobre todas as nações (8-9). E o que dizer do governo providencial de Cristo sobre os ímpios réprobos? É esse parcialmente um governo de amor para eles e parcialmente um governo de ira santa contra eles? Não, é inteiramente desse último tipo: “Tu os esmigalharás com uma vara de ferro; tu os despedaçarás como a um vaso de oleiro” (9). Em termos teológicos, os eleitos estão debaixo do reino de graça de Cristo; os réprobos estão debaixo do seu reino de poder (não graça).

O chamado do evangelho está presente no Salmo 2: “confiem” em Cristo (12), “sede prudentes” e “deixai-vos instruir” (10). “Servi ao SENHOR com temor, e alegrai-vos com tremor” (11). “Beijai o Filho” — um ato de homenagem e submissão — para que não “pereçais” sob o seu furor e “ira”, algo que pode acontecer “em breve” (12).

O Salmo 2 terminar da forma que o Salmo 1 começa, com uma afirmação da bem-aventurança do povo eleito de Deus: “Bem-aventurados todos aqueles que nele confiam” (Sl 2.12). Aqueles que não creem não são bem-aventurados, mas malditos (Gl 3.6-14; Dt 27.11-28.68).


Fonte: http://www.cprf.co.uk/crnews/crnmay2010.htm

Tradução: Felipe Sabino de Araújo Neto – abril/2011

ALGUÉM COMO EU



IMPOSSÍVEL NÃO CHORAR...

O VERDADEIRO JULGAMENTO SE APROXIMA

VINGADOR

Quatro super-heróis se unem no “A Iniciativa Vingadores” — Thor, O Incrível Hulk, Capitão América e Iron Man — uma união dos maiores poderes do mundo, convocados quando o mal cósmico ameaça o planeta.

Essa é a história por detrás de Os Vingadores (2012), um filme que reúne esses quatro super-heróis numa liga. E as audiências têm respondido. Em seus três primeiros dias nos cinemas dos Estados Unidos, o filme alcançou o recorde esmagador de 200 milhões de dólares em bilheteria.

Somos atraídos por esse time de super-heróis porque eles são uma equipe convocada para suprimir o mal. Mas quando saímos do cinema, nos deparamos com perguntas. Por que não vemos Deus destruindo o mal com espada, martelo e punhos? Onde Deus está quando coisas ruins acontecem? Onde Deus está quando os indefesos são abusados? Onde Deus está quando ditadores malignos são seguidos? Onde Deus está quando órfãos são traficados? Por que Deus não intervém na história e acaba com as forças das trevas?

Ansiamos que Deus entre neste mundo, pegue os ditadores orgulhosos e egoístas, os falsos messias e os abusadores. Queremos que Deus pegue o mal pelos pés, como Hulk com o auto-proclamado salvador Loki, e o chicoteie violentamente no concreto como uma boneca de pano. “Deus franzino”, é a única fala de Hulk no filme, e é muito verdadeira. Loki é um deus franzino nas mãos de um Hulk vivo.


“Vingança” é um substantivo, “vingar” é um verbo, e os Vingadores são especialmente ativos em sua defesa contra o mal. Eles são os mocinhos, mas são aqueles que nos lembram que o ato de violência é correto — às vezes. Mas quando, e por quem?

Quando necessário, o governo pode desembainhar a espada e vingar como um servo do Vingador (Romanos 13.4). Mas isso nunca é verdadeiro sobre a Igreja.

“Não vos vingueis a vós mesmos, amados, mas dai lugar à ira, porque está escrito: Minha é a vingança; eu recompensarei, diz o Senhor.” (Romanos 12.19)

Em vez de vingança, os cristãos são chamados a oferecer os dois lados da face, perdoar 70 vezes 7, não pagar o mal com mal, e não vingar nada. Somos livres para viver com gentileza e tolerância pois, como Paulo menciona, Deus é o Vingador.

Deus é aquele que paga todo ato mal de pecado e rebelião com sua justa vingança. Para aqueles que se humilham na cruz, a ira do Vingador por nossos pecados — passados, presentes e futuros — caiu sobre Cristo. Para os impenitentes e para aqueles que vivem em contínua rebelião contra Deus, o fogo eterno do inferno revelará a ira do Vingador.


Em todo caso, na cruz ou no julgamento eterno, a vingança de Deus é revelada contra cada ato de rebelião, cada ato de pecado. No final, sua vingança é uma revelação de si mesmo.

“Só existe um Deus”, disse o Capitão América.

“Deus somente é o Vingador”, escreveu Martinho Lutero.

“O SENHOR Deus, a quem a vingança pertence, ó Deus, a quem a vingança pertence, mostra-te resplandecente”, cantou o salmita (Salmos 94.1).

Essa não é como a raiva de retaliação de Hulk. A vingança brilhante de Deus é sua resposta justa ao pecado. É a sua santa sanidade. É uma revelação de si mesmo a qual os cristãos são chamados a adorar.

E embora os Vingadores sejam chamados para restringir as forças malignas, eles são um eco distante dAquele que destroçou, e irá novamente, destroçar o mal, e o fará para sempre.

A vingança de Deus nos lembra que nenhum de nós pode escapar do poder do pecado e de suas justas consequências. Gostaríamos de mudar o foco para os ditadores galáticos malignos, mas não podemos escapar da realidade que somos todos culpados de rebelião por ignorar a Cristo. E Deus é o Vingador de toda rebelião, assim como de nosso motim egocêntrico que despreza o seu Filho amado. O Vingador virá “tomando vingança dos que não conhecem a Deus e dos que não obedecem ao evangelho de nosso Senhor Jesus Cristo (2 Tessalonicenses 1.8).

Esse julgamento está chegando. Em breve! Pela fé, vemos a justa vingança vindoura de Deus e corremos para o Sangue de Cristo, e encontramos em Cristo o lugar onde a vingança da santa ira de Deus foi derramada e extinguida, de forma que nossa alegria possa ser plena e completa para sempre.


Tradução: Felipe Sabino de Araújo Neto

Fonte: Desiring God

A IGREJA SEGUNDO AS ESCRITURASI

IGREJA BÍBLICA

POR J.C.RYLE

O conceito de igreja é básico para uma compreensão adequada do cristianismo. Se não for bíblico o fundamento sobre o qual se descansa a noção de igreja, facilmente se incorrerá, como assim tem demonstrado a história do cristianismo, em certos erros doutrinários de lamentáveis consequências. Justificada é, pois, nossa asserção de que, uma boa parte das diferenças que nos separam de Roma, se originam em uma noção distinta do conceito de igreja. Como veremos adiante, as Escrituras nos apresentam um conceito da Igreja sob diferentes aspectos. Estes aspectos, tomados unitariamente e em sua vinculação própria, colocam de forma clara a natureza e o caráter da Igreja de Jesus Cristo.
A Igreja Invisível e visível
Sob esta designação de visível e invisível não estamos nos referindo a duas igrejas distintas. Cristo fundou uma só Igreja; mas segundo os ensinamentos da Santa Palavra, a Igreja exibe um caráter duplo: por um lado é invisível, a saber, ela escapa e vai muito além do que é sensível; por outro lado, a Igreja de Cristo se exterioriza em agrupações e congregações visíveis ao olho humano. Segundo um polemista católico romano Bossuet, a noção de igreja invisível e visível é uma invenção protestante. Porém, na realidade este conceito está baseado e tem um fundamento na Palavra de Deus. Uma e outra vez os profetas do Antigo Testamento lembram ao povo judeu que, o simples fato de pertencer ao Israel Visível, isto não era prova suficiente de que eram membros do Israel de Deus – do Israel espiritual, invisível. Dentro do Israel Visível os profetas fazem distinção e nos falam de um remanescente espiritual (Esdras 9.8; Isaías 1.9; 20.21; Jeremias 23.3; Ezequiel 6.8). O profeta Elias acreditava que toda a nação de Israel havia apostatado, e que somente ele havia se mantido nos caminhos do Deus verdadeiro; mas o Senhor lhe revelou que, todavia ainda restavam sete mil israelitas que não haviam dobrado seus joelhos a Baal; estes além de serem cidadãos do Israel terrestre, eram também cidadãos do Israel espiritual, invisível. A mesma ideia encontramos no apóstolo Paulo quando disse: “Porque não é judeu que o é apenas exteriormente, nem é circuncisão a que é somente da carne. Porém judeu é aquele que o é interiormente, a circuncisão, a que é do coração, no espírito, não segundo a letra, e cujo louvor não procede dos homens, mas de Deus”(Romanos 2.28-29). O próprio Senhor Jesus se referia a esta dupla distinção entre os israelitas quando contestou os fariseus que se orgulhavam de ser filhos de Abraão ( João 8.37,39,44 ). Havia, pois, judeus que pertencia m a Israel como nação visível, em consequência, eram filhos de Abraão segundo a carne, os quais, além do mais, pertenciam ao Israel de Deus – espiritual e invisível. Porém, por outro lado, a maioria do povo judeu, ainda que sendo cidadãos de Israel, e descendentes de Abraão, não pertenciam ao Israel de Deus. A Igreja de Cristo se identifica com o Israel de Deus, e nos oferece também um aspecto visível, e outro invisível. Os verdadeiros filhos de Deus, além de ter sua membresia em alguma igreja visível, formam parte do corpo místico de Cristo que é a Igreja Invisível. Os hipócritas e os falsos convertidos, e muitos outros que de uma maneira externa professam a fé evangélica, e se ajuntam ao número dos crentes, só externamente são membros da Igreja de Cristo, e unicamente no aspecto visível da mesma. Estes são os que no dia do juízo dirão: “... Senhor, Senhor! Porventura, não temos profetizado em teu nome, e em teu nome não expelimos demônios, e em teu nome não fizemos muitos milagres?” Porém aos tais ele dirá: “Nunca vos conheci. Apartai-vos de mim, os que praticais a iniquidade”. (Mateus 7.22-23).
A Igreja Invisível
O conjunto de todos os crentes, na terra e no céu, redimidos com o sangue precioso de Cristo, e unidos espiritualmente a Ele, constituem a Igreja Invisível. Chama-se invisível por sua natureza espiritual – que escapa e vai muito mais além dos sentidos; e também por não se poder determinar estreitamente, a partir de um ponto de vista humano, quem são aqueles que pertencem a mesma. A união dos crentes com Cristo é uma união mística. Os laços com os quais o Espírito Santo estabelece essa união são invisíveis. A totalidade dos que formam a Igreja Invisível não cai dentro da percepção do olho humano; muitos de seus membros não podem ser já vistos, pois estão no céu; eles são os que constituem a hoste vitoriosa da chamada Igreja Triunfante. Muitos outros membros da Igreja Invisível estão espalhados pela terra; alguns talvez perdidos pelos desertos, pelos montes, pelas covas, e pelas cavernas da terra – desprezados e ignorados pelos homens, porém, escolhidos e amados por Cristo. Ah! Não pode a visão do homem abarcar o glorioso panorama do Corpo de Cristo: A Igreja Invisível.
Esta é a Igreja da qual o mesmo Senhor disse: “E as portas do inferno não prevalecerão contra ela”. Pelo testemunho da história sabemos que muitas igrejas locais que se afastaram da fé e tem caído em completa apostasia, as portas destas fecharam. Mas a promessa do Senhor Jesus não se refere diretamente a congregações locais visíveis, e sim a Igreja Invisível – corpo dos redimidos que pertencem a Cristo, sem distinção de tempo nem lugar.
A Igreja Invisível mantém uma íntima relação com Cristo. No Novo Testamento esta relação é expressa sob diversas analogias. Em sua epístola aos Efésios, Paulo designa a Igreja como a Esposa de Cristo. Porém, de todas as analogias, a que mais expressa vivamente a união mística entre Cristo e a sua Igreja, é aquela do corpo humano e a cabeça. Daí Paulo recorrer a ela tantas vezes, e que em suas epístolas desenvolve tão amplamente a relação espiritual entre Cristo – a Cabeça, e a Igreja – o Corpo. Esta união mística não se estabelece por meio de uma hierarquia eclesiástica visível, mas é fruto da maravilhosa obra do Espírito Santo: “Porque, assim como o corpo é um e tem muitos membros, e todos os membros, sendo muitos, constituem um só corpo, assim com respeito a Cristo. Pois, em um só Espírito, todos nós fomos batizados em um corpo, quer judeus, quer gregos, quer escravos, quer livres. E a todos nós foi dado beber de um só Espírito”.(1 Coríntios 12.12-13).
Cristo é a cabeça deste corpo místico que é a Igreja: “E é a cabeça do corpo que é a Igreja”. (Veja Efésios 1.22-23; 4.4,16; 5.23,30). Vemos nestes versículos, que o corpo recebe vida da cabeça; assim como os ramos vida da videira, do mesmo modo a Igreja recebe vida de Cristo; da mesma maneira como os membros do corpo obedecem a cabeça, assim a igreja obedece a Cristo; da mesma forma como a união entre o corpo e a cabeça é uma união vital, assim também a Igreja está vitalmente unida a Cristo. As Escrituras uma e outra vez coloca em relevo o caráter espiritual da Igreja de Cristo; os outros aspectos da Igreja fundamentam-se neste caráter espiritual e invisível. A mente carnal é cega a esta natureza espiritual da Igreja, e a concebe segundo os esquemas de uma organização eclesiástica visível.
A Igreja Visível
Sob este aspecto a Igreja compreende a todos aqueles que ante os olhos do mundo professam a fé cristã, e observam os mandamentos e ordenanças promulgadas por Cristo. Assim como a Igreja Invisível está constituída unicamente por redimidos por Cristo, a Igreja Visível, além dos crentes, inclui homens e mulheres que de uma maneira externa professam a fé evangélica. Tanto a Bíblia como as experiências provam que no seio da Igreja Visível tem se ocultado homens não salvos. Em certas ocasiões nem ainda os apóstolos podiam impedi-los, é somente Deus que pode ler os corações.
Na Palavra de Deus encontramos repedidas alusões a este aspecto visível da Igreja. Nos Atos dos Apóstolos o evangelista Lucas se refere a ela com as seguintes: “E o Senhor acrescentava dia-a-dia à Igreja os que iam sendo salvos”. (Atos 2.47). Escrevendo aos coríntios o apóstolo fez menção da provisão ministerial e governativa com a que Cristo tem dotado a Igreja Visível: “E a uns pôs Deus na Igreja, primeiramente apóstolos, depois profetas, em terceiro lugar doutores e mestres; dons de curar, misericórdias, governos, variedades de línguas”. (1 Coríntios 12.28). Os ofícios e ordenanças que são detalhados aqui implicam em uma estrutura social externa e visível.
Temos dito que a Igreja em seu aspecto visível não está formada de uma membresia única – tal como acontece com a Igreja Invisível constituída por todos os redimidos -, mas que abriga em sua comunhão, além dos crentes, grande número de pessoas externamente professa a fé evangélica mas que na realidade não são salvos. Este fato se aprecia muito bem em algumas parábolas de nosso Senhor. Sob o título “reino dos céus” o Senhor se refere a Igreja Visível, e assim, nos diz em Mateus 13.47-49: “O reino dos céus é semelhante a uma rede, que é lançada no mar, colhe de todas as sortes de peixes. E quando está cheia, os pescadores arrastam-na para a praia e, assentados, escolhem os bons para os cestos e os ruins deitam fora”. A separação entre os bons e os maus terá lugar no fim do mundo. A mesma ideia de coexistência de pessoas salvas e não salvas na igreja visível se nos apresenta na parábola daquele homem que semeia a boa semente no campo, mas “dormindo seus guardas, veio o seu inimigo, e semeou joio no meio do trigo”. No tempo da colheita, a saber, no fim do mundo, se fará separação entre o joio e o trigo – entre os crentes e os hipócritas -. A relação que existe entre a videira e os ramos, e que o próprio Senhor Jesus nos menciona, põe ainda mais em relevo o que já vimos, dizendo: “Eu sou a videira verdadeira, e meu Pai é o lavrador. Todo ramo que, estando em mim, não dar fruto, ele o corta; e todo o que dá fruto ele o limpa, para que produza mais fruto ainda”.
“Eu sou a videira, vós os ramos... o que em mim não estiver será lançado fora como mau ramo” João 15. O verdadeiro crente, qual ramos unidos à videira, mantém uma união espiritual com Cristo e, em consequência disso, produzem frutos. Mas os hipócritas, aqueles que não são salvos, e que, no entanto, filiam-se a membresia da Igreja Visível, por manter somente uma relação externa com Cristo, semelhante aos ramos que não estão unidos a videira, serão lançados fora.
A Igreja Invisível mantém, com respeito a seus membros, uma relação íntima e espiritual com Cristo; enquanto que a Igreja, em seu aspecto visível, mantém uma relação externa. No caso dos crentes verdadeiros, esta relação externa é expressão visível daquela íntima relação espiritual que lhes une a Cristo. A Igreja Invisível está constituída, unicamente, pelos redimidos; enquanto que a Igreja Visível está formada por aqueles que externa e visivelmente confessam a Cristo, e pode incluir, além dos crentes verdadeiros, pessoas não são salvas.
Estes dois aspectos – visível e invisível -, sob os quais se nos apresenta a Igreja nas Escrituras, são básicos para uma compreensão bíblica da natureza da Igreja. Eles são, além do mais, os que colocam de forma bastante clara os erros da concepção romanista de Igreja. A Igreja Católica Romana atribui à Igreja Visível grande números das características que, segundo as Escrituras, só podem ser aplicados à Igreja Invisível.

A Igreja Católica e Local

A Igreja Local

Com frequência o termo igreja é usado nas Escrituras para designar um grupo de crentes em um determinado lugar. Ainda que seja no caso de que sejam dois ou três crentes que se reúnem para orar e adorar ao Senhor, o Novo Testamento emprega o termo igreja[1]para designar os tais. O mesmo acontece com grupos de crentes que, todavia, não foram organizados sob a supervisão de presbíteros e pastores. Em atos dos Apóstolos é-nos dito que Paulo e Barnabé “constituíram presbíteros em cada uma das igrejas” Atos 14.23. O qual demonstra que, ainda antes de ter presbíteros, tais grupos já se constituíam verdadeiras igrejas. O apóstolo Paulo reconhece como verdadeira Igreja o grupo de crentes que se reúnem em uma casa particular, em suas epístolas temos vários exemplos: “Saudai a Priscila e Áquila... do mesmo modo a igreja de sua casa” Romanos 16.3,5. “Saudai aos irmãos que estão em Laudicéia, e a Ninfas, e a Igreja que está em sua casa” Colossenses 4.16 (veja-se também 1 Corintios 16.19; Filemon 23).
A Igreja Católica ou Universal
Temos visto que segundo o Novo Testamento, ainda que seja um pequeno grupo de crentes que se reúnem em uma casa particular constitui uma igreja. Agora bem, a igreja local, por menor que seja, mantém uma relação importantíssima coma as outras igrejas cristãs. O crente, por cima de sua igreja local, confessa a sua crença em uma Igreja Universal: “Creio na Igreja Católica”. Como devemos entender esta confissão? Que relação há entre a congregação local e a Igreja Universal? Em que consiste a universalidade da Igreja? A universalidade ou catolicidade da Igreja é dupla: Concerne a Igreja em seu aspecto visível e invisível[2].
Em seu aspecto invisível
A igreja é católica pelo fato de não está restringida a nenhuma limitação de lugar e tempo.[3] Na dispensação judaica, a igreja não era católica, mas local; seu centro estava em Jerusalém; ali tinha o seu templo, seu altar, seu sacerdócio. Porém, na nova dispensação a Igreja desborda toda a limitação local. “A hora vem, e agora é, quando os verdadeiros adoradores adorarão ao Pai em espírito e em verdade”. João 4.23. Em qualquer lugar da terra onde se encontra um crente, ali há um verdadeiro Templo do Senhor; ali pode Deus ser adorado em Espírito e em verdade. Desaparece o sacerdócio de Arão com a vinda do Sumo Sacerdote que, havendo feito a propiciação pelos pecados do povo, agora vive para sempre interceder por eles. As barreiras da dispensação mosaica foram derrubadas, e a plenitude do Espírito Santo se derrama sobre a Igreja. É o Espírito Santo quem estabelece a universalidade da Igreja. A ação unificadora do Espírito Santo faz desaparecer toda diferença de raça, língua e distância. A comunhão de um mesmo Espírito faz com que os crentes de todos os lugares e tempos experimentem uma maravilhosa unidade espiritual em Cristo. É em virtude, pois, dos laços de um mesmo Espírito, e da participação de uma vida espiritual comum em Cristo, que a Igreja local se relaciona com o conjunto de todas as igrejas cristãs.
Em seu aspecto visível
A igreja é católica por quanto todos os seus membros professam a mesma fé em Cristo. Assim como a Igreja Invisível a universalidade vem determinada pela participação de um mesmo Espírito, no caso da Igreja Visível a catolicidade vem determinada pela profissão de uma mesma fé. Por cima das diferenças de língua, raça, e denominação, as igrejas evangélicas confessam a mesma fé em Cristo Jesus.
Os evangélicos são acusados a vontade de estarem divididos na doutrina, e desta forma não exibem a catolicidade da fé; porém, os que assim nos combatem não param para considerar que o amplo horizonte doutrinário que, por cima das diferenças denominacionais, une as igrejas evangélicas. Se compararmos os credos e confissões doutrinárias das denominações evangélicas mais importantes, se observará uma crença comum nas doutrinas essenciais da fé cristã. Todas proclamam a autoridade na Bíblia, a Trindade, a Criação, a Queda do homem, a divindade de Cristo, a Salvação através da Obra de Cristo, a Justificação pela Fé somente, o Juízo Final, a Realidade do Céu e do Inferno, a Segunda Vinda de Cristo, etc. Os desacordos e diferenças entre as igrejas evangélicas estão inseridos naquilo que não impedem a salvação de pecadores. Algumas destas diferenças devem-se a causas históricas, outras nasceram como resultado de distintas interpretações e de certas profecias escatológicas; outras provêm de um triste apego às tradições humanas; porém, mui possivelmente, a maior parte das diferenças dentro do campo evangélico se devem ao pecado.
O crente evangélico não deve se contentar pensando que no que se refere ao coração da mensagem evangélica há universalidade de fé entre as igrejas evangélicas, mas, antes de tudo, deve orar e fazer tudo o que estiver ao seu alcance para que a Igreja Visível, ainda que seja nos temas e nos detalhes mais insignificantes possa revelar a unidade e catolicidade.

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Fonte: Revista Tu Reino, número 6 de maio a dezembro de 1994, paginas 27 a 31.
Tradução: João Ricardo Ferreira de França. Formado em Teologia pelo Seminário Presbiteriano do Norte (SPN). Leciona no Seminário Presbiteriano fundamentalista do Brasil.

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Notas:
[1] O termo Igreja, no grego significa literalmente “os chamados para fora”, são chamados do mundo para serem consagrados a Deus (NT).
[2] Na realidade o catolicismo romano não nega este aspecto de invisibilidade da Igreja de Cristo, mas o suprime e faz depender do aspecto visível. “Primeiro está a Igreja Visível, e logo vem a Invisível”. Desta crença surgem as tristes conclusões da Teologia Católica com respeito a natureza da Igreja. Ao aspecto visível Roma aplica notas e características que são próprias do aspecto invisível da Igreja.
[3] Este tem sido o erro da Igreja Católica Romana, pois, a Igreja não pode ser católica e ao mesmo tempo
Romana, tal postulação é uma contradição de discurso – elimina o conceito de catolicidade da Igreja de Cristo. Isso porque a Igreja Romana está limitada, em sua nomenclatura, a uma localidade (NT).

SEIS COMPONENTES DO ARREPENDIMENTO

ARREPENDIMENTO

O arrependimento é uma graça do Espírito de Deus por meio da qual um pecador é humilhado em seu íntimo e transformado em seu exterior. A fim de proporcionar melhor entendimento, saiba que o arrependimento é um remédio espiritual formado de seis componentes especiais… Se um for deixado fora, o arrependimento perde o seu poder.

Componente 1: Percepção do pecado. A primeira parte do remédio de Cristo são olhos abertos (At 26.18). Este é um dos fatos importantes a observarmos no arrependimento do filho pródigo: ele caiu em si (Lc 15.17). Ele se viu como pecador e nada mais do que um pecador. Antes que um homem venha a Cristo, ele tem primeiramente de vir a si mesmo. Em sua descrição de arrependimento, Salomão considerou isto como o primeiro componente: “Caírem em si” (1 Rs 8.47). Uma pessoa deve, antes de tudo, reconhecer e considerar o que é o seu pecado e conhecer a praga de seu coração, antes que seja devidamente humilhado por ela. A primeira coisa que Deus criou foi a luz. Portanto, a primeira coisa que deve haver em uma pessoa arrependida é a iluminação. “Agora, sois luz no Senhor” (Ef 5.8). Os olhos são feitos tanto para ver como para chorar. Antes de lamentarmos pelo pecado, temos de vê-lo. Disso, podemos inferir que, onde não percepção do pecado, não pode haver arrependimento. Muitos que acham falhas nos outros não vêem nenhum erro em si mesmos… Pessoas são vendadas por ignorância e amor próprio. Por isso, não vêem o que deforma a sua alma. O Diabo faz com elas como o falcoeiro faz à sua ave: ele as cega e as leva encapuzadas ao inferno.

Componente 2: Tristeza pelo pecado. “Suporto tristeza por causa do meu pecado” (Sl 38.18). Ambrósio chamava essa tristeza de amargura da alma. A palavra hebraica que se traduz por ficar triste significa “ter a alma, por assim dizer, crucificada”. Isso precisa estar presente no verdadeiro arrependimento. “Olharão para aquele a quem traspassaram… e chorarão” (Zc 12.10), como se sentissem os cravos da cruz penetrando o seu lado. Uma mulher pode esperar ter um filho sem dores, assim como alguém pode esperar arrepender-se sem tristeza. Aquele que crê sem duvidar, põe sob suspeita a sua fé; aquele que se arrepende sem entristecer-se nos deixa incertos de seu arrependimento… Esta tristeza pelo pecado não é superficial; é uma agonia santa. Nas Escrituras, ela é chamada de quebrantamento de coração: “Sacrifícios agradáveis a Deus são o espírito quebrantado; coração compungido e contrito, não o desprezarás, ó Deus” (Sl 51.17); um rasgamento do coração: “Rasgai o vosso coração” (Jl 2.13). As expressões bater no peito (Jr 31.19; Lc 18.13), cingir o cilício (Is 22.12), arrancar os cabelos (Ed 9.3) – todas essas expressões são apenas sinais exteriores de tristeza.

Essa tristeza implica (1) tornar a Cristo precioso. Oh! quão precioso é o Salvador para uma alma atribulada! Agora, Cristo é, de fato, Cristo; e a misericórdia é realmente misericórdia. Enquanto o coração não estiver repleto de compunção, ele não estará pronto para o arrependimento. Quão bem-vindo é um cirurgião para um homem que sangra por suas feridas! (2) Implica repelir o pecado. O pecado gera tristeza, e a tristeza mata o pecado… A água salgada das lágrimas mata o verme da consciência. (3) Implica preparar-se para receber firme consolo. “Os que com lágrimas semeiam com júbilo ceifarão” (Sl 126.5). O penitente tem uma semeadura de lágrimas, mas uma colheita deliciosa. O arrependimento rompe os abscessos do pecado, e, em seguida, a alma fica tranqüila… O ato de Deus em afligir a alma por causa do pecado é como o agitar da água que trazia cura, no tanque (Jo 5.4)

Contudo, nem toda tristeza evidencia o verdadeiro arrependimento… o que é esse entristecer piedoso? Há seis descrições:

1. A verdadeira tristeza espiritual é interior. É interior em duas maneiras: (1) é uma tristeza de coração. A tristeza dos hipócritas evidencia-se somente em sua face. “Desfiguram o rosto” (Mt 6.16). Mostram um rosto melancólico, mas a tristeza deles não vai além disso, como o orvalho que umedece a folha, mas não penetra a raiz. O arrependimento de Acabe foi uma exibição exterior. Seus vestidos foram rasgados, mas não o seu espírito (1 Rs 21.27). A tristeza segundo Deus avança mais além; é como uma veia que sangra internamente. O coração sangra por causa do pecado – “Compungiu-se-lhes o coração” (At 2.37). Assim como o coração tem a parte principal no ato de pecar, o mesmo deve acontecer no caso do entristecer-se. Paulo lamentava por causa da lei em seus membros (Rm 7.23). Aquele que lamenta verdadeiramente o pecado se entristece por conta das incitações do orgulho e da concupiscência. Ele se entristece por causa da “raiz de amargura”, embora ela nunca prospere até ao ponto de levá-lo a agir. Um homem ímpio pode sentir-se atribulado por pecados escandalosos; um verdadeiro convertido lamenta os pecados do coração.

2. A tristeza espiritual é sincera. É a tristeza pela ofensa, e não pela punição. A lei de Deus foi infringida, e seu amor, abusado. Isso leva a alma às lágrimas. Uma pessoa pode ficar triste e não se arrepender. Um ladrão fica triste quando é apanhado, mas não por causa do roubo, e sim porque tem de sofrer a pena… A tristeza piedosa se expressa principalmente por causa da transgressão contra Deus. Portanto, se não houvesse uma consciência a ferir, uma diabo a acusar, um inferno para servir de castigo, a alma ainda se sentiria triste por causa da ofensa praticada contra Deus… Oh! que eu não ofenda o meu bom Deus, nem entristeça o meu Consolador! Isso parte o meu coração!…

3. A tristeza espiritual Deus é repleta de confiança. É mesclada com fé… A tristeza bíblica afundará o coração, se a roldana da fé não o erguer. Assim como o nosso pecado está sempre diante de Deus, assim também a promessa de Deus tem de estar sempre diante de nós…

4. A tristeza espiritual é uma grande tristeza. “Naquele dia, será grande o pranto em Jerusalém, como o pranto de Hadade-Rimom” (Zc 12.11). Dois sóis se puserem no dia em que Josias morreu, e houve um enorme lamento fúnebre. A tristeza pelo pecado deve chegar a esse nível.

5. A tristeza espiritual é, em alguns casos, acompanhada de restituição. Aquele que, por injustiça, errou contra outrem, em seus bens, lidando com fraude, deve em sã consciência realizar a compensação. Há um mandamento claro quanto a isso: “Confessará o pecado que cometer; e, pela culpa, fará plena restituição, e lhe acrescentará a sua quinta parte, e dará tudo àquele contra quem se fez culpado” (Nm 5.7). Por isso, Zaqueu fez restituição: “Se nalguma coisa tenho defraudado alguém, restituo quatro vezes mais” (Lc 19.8).

6. A tristeza espiritual é permanente. Não são algumas lágrimas derramadas ocasionalmente que servirão. Alguns derramarão lágrimas ao ouvirem um sermão, mas isso é como uma chuva de abril – logo acaba – ou como uma veia aberta e fechada novamente. A verdadeira tristeza tem de ser habitual. Ó cristão, a doença de sua alma é crônica, e a recaída, freqüente. Portanto, você tem de tratar-se com remédio continuamente, por meio do arrependimento. Essa é a tristeza “segundo Deus”.

Componente 3: Confissão de pecado. A tristeza é um sentimento tão forte, que terá expressões. Suas expressões são lágrimas nos olhos e confissão nos lábios. “Os da linhagem de Israel… puseram-se em pé e fizeram confissão dos seus pecados” (Ne 9.2). Gregório de Nazianzo chamou a confissão de “um bálsamo para a alma ferida”.

A confissão é auto-acusadora. “Eu é que pequei” (2 Sm 24.17)… E a verdade é que por meio desta auto-acusação impedimos Satanás de acusar-nos. Em nossas confissões, nos identificamos com orgulho, infidelidade e paixão. Assim, quando Satanás, chamado de acusador dos irmãos, lançar essas coisas contra nós, Deus lhe replicará: “Eles já acusaram a si mesmos. Então, Satanás, você está destituído de motivos legítimos; suas acusações surgiram muito tarde…” Agora, ouça o que diz o apóstolo Paulo: “Se nos julgássemos a nós mesmos, não seríamos julgados” (1 Co 11.31).

Entretanto, homens ímpios, como Judas e Saul, não confessaram seus pecados? Sim, mas as suas confissões não eram verdadeiras. Para que a confissão de pecado seja correta e genuína, estas… qualificações precisam estar presentes:

1. A confissão tem de ser espontânea. Tem de surgir como a água que brota do manancial, livremente. A confissão do ímpios é obtida à força, como a confissão de um homem sob tortura. Quando uma faísca da ira de Deus atinge a consciência dos ímpios ou estão sob o temor da morte, eles se prostrarão em confissão… Mas a verdadeira confissão flui dos lábios tal como a mirra jorra da árvore ou o mel da colméia, espontaneamente…

2. A confissão tem ocorrer com contrição. O coração precisa ressentir profundamente o pecado. As confissões de um homem natural procede de seu íntimo assim como uma água que passa por um cano. Elas não o afetam de maneira alguma. Mas a confissão verdadeira deixa impressões que pungem o coração. Ao confessar seus pecados, a alma de Davi sentiu-se sobrecarregada: “Já se elevam acima de minha cabeça as minhas iniqüidades; como fardos pesados, excedem as minhas forças” (Sl 38.4). Uma coisa é confessar o pecado, outra coisa é sentir o pecado.

3. A confissão tem de ser sincera. Nosso coração precisa estar em harmonia com a confissão. O hipócrita confessa o pecado, mas o ama, assim como um ladrão que confessa os bens roubados e continua a amar o roubo. Quantos confessam o orgulho e a cobiça, com seus lábios, mas se deleitam neles ocultamente… Um verdadeiro cristão é mais honesto. Seu coração anda em harmonia com usa língua. Ele é convencido dos pecados que confessa e detesta os pecados dos quais é convencido.

4. Na confissão verdadeira, o crente especifica o pecado. O ímpio reconhece que é um pecador como todos os outros. Ele confessa o pecado de maneira geral… Um verdadeiro convertido reconhece seus pecados específicos. Ele se comporta à semelhança de uma pessoa enferma que vai ao médico e lhe mostra as feridas, dizendo: “Levei um corte na cabeça, recebi um tiro no braço”. O pecador entristecido confessa as diversas imperfeições de sua alma… Por meio de uma inspeção diligente de nosso coração, podemos achar alguns pecados específicos que tratamos com indulgência. Confessemos com lágrimas esses pecados, indicando-os pelo nome.

5. Um pessoa verdadeiramente arrependida confessa o pecado em sua fonte. Ela reconhece a contaminação de sua natureza. O pecado de nossa natureza não é somente uma falta do bem, mas também uma infusão do mal… Nossa natureza é um abismo e uma fonte de todo mal, dos quais procedem os escândalos que infestam o mundo. É essa depravação de natureza que envenena nossas coisas santas. Isso traz os juízos de Deus e paralisa em sua origem as nossas misericórdias. Oh! Confesse o pecado em sua fonte!…

Componente 4: Vergonha pelo pecado. O quarto componente no arrependimento é a vergonha. “Para que… se envergonhe das suas iniqüidades” (Ez 43.10). O envergonhar-se é a força da virtude. Quando o coração se enegrece por causa do pecado, a graça faz o rosto envergonhar-se com rubor – “Estou confuso e envergonhado, para levantar a ti a face” (Ed 9.6). O filho pródigo, arrependido, ficou tão envergonhado de seus excessos que se julgava indigno de ser, outra vez, chamado filho (Lc 15.21). O arrependimento causa um acanhamento santo. Se Cristo não estivesse no coração do pecador, não haveria tanta vergonha se expressando no rosto. Há… algumas considerações sobre o pecado que nos causa vergonha:

1. Todo pecado nos torna culpados, e a culpa nos deixa envergonhados.

2. Em todo pecado, há muita ingratidão. E essa é a razão da vergonha. Abusar da bondade de Deus, como isso nos envergonha!… Ingratidão é um pecado tão grave, que Deus mesmo se admira dele (Is 1.2).

3. O pecado mostra o que somos, e isso nos causa vergonha. O pecado nos rouba as vestes de santidade. E nos deixa destituídos de pureza, deformados aos olhos de Deus; e isso nos envergonha…

4. Nossos pecados expuseram Cristo à vergonha. E não nos envergonharemos deles? Vestimos a púrpura; não vestiremos o carmesim?

5. Aquilo que nos deixa envergonhados é o fato de que os pecados que cometemos são piores do que os pecados dos incrédulos. Agimos contra a luz que possuímos.

6. Nossos pecados são piores do que os pecados dos demônios. Os anjos caídos nunca pecaram contra o sangue de Cristo. Cristo não morreu por eles… Com certeza, se sobrepujamos o pecado dos demônios, isso deve nos causar muita vergonha.

Componente 5: Ódio pelo pecado. O quinto componente do arrependimento é o ódio pelo pecado. Os eruditos distinguem dois tipos de ódio: o ódio das iniqüidades e o ódio da inimizade.

Primeiramente, há um ódio ou abominação das iniqüidades. “Tereis nojo de vós mesmos por causa das vossas iniqüidades e das vossas abominações” (Ez 36.31). Um cristão verdadeiramente arrependido é alguém que detesta o pecado. Se uma pessoa detesta aquilo que faz seu estômago adoecer, ela deve, com muito mais intensidade, detestar aquilo que deixa enferma a sua consciência. É mais fácil abominar o pecado do que deixá-lo… Não amamos a Cristo enquanto não odiamos o pecado. Nuca anelamos o céu enquanto não detestamos o pecado.

Em segundo, há um ódio da inimizade. Não há melhor maneira de descobrir vida do que por meio do movimento. Os olhos se movem, o pulso bate. Portanto, para constatar o arrependimento, não há sinal melhor do que uma antipatia santa para com o pecado… O arrependimento correto começa no amor a Deus e termina no ódio ao pecado.

Como podemos discernir o verdadeiro ódio para com o pecado?

1. Quando a pessoa se mantém resoluta contra o pecado. A língua lamenta amargamente o pecado, e o coração o odeia, de modo que, embora o pecado se apresente de forma atraente, nós o achamos detestável e o abominados com ódio mortal, sem levarmos em conta a sua aparência agradável… O diabo pode vestir e disfarçar o pecado com prazer e proveito, mas um verdadeiro penitente, que tem ódio secreto pelo pecado, sente repulsa e não se envolverá nele.

2. O verdadeiro ódio pelo pecado é abrangente. Isso se aplica a dois aspectos: no que diz respeito às faculdades e ao objeto. (a) O ódio pelo pecado é abrangente no que concerne às faculdades da alma, ou seja, há um desgosto para com o pecado não somente no juízo, mas também na vontade e nas afeições. Há alguns que são convencidos de que o pecado é maligno e, em seu juízo, têm uma aversão para com ele. Mas acham-no agradável e têm satisfação íntima nele. Nesse caso, há um desprazer do pecado no juízo e um aceitação dele nas afeições. No verdadeiro arrependimento, o ódio pelo pecado está presente em todas as faculdades da alma; não somente no intelecto, mas, principalmente, na vontade. “Não faço o que prefiro, e sim o que detesto” (Rm 7.15). Paulo não era livre do pecado, mas a sua vontade se posicionava contra o pecado. (b) O ódio pelo pecado é abrangente no que concerne ao objeto. Aquele que odeia um pecado odeia todos… Os hipócritas odeiam alguns pecados que mancham sua reputação, mas o verdadeiro convertido odeia todos os pecados: os pecados que produzem vantagem, os pecados resultantes de nossas inclinações naturais, as próprias instigações da corrupção. Paulo odiava as obras do pecado (Rm 7.23).

3. O verdadeiro ódio pelo pecado se manifesta contra o pecado em todas as suas formas. Um coração santo detesta o pecado por causa de sua contaminação natural. O pecado deixa uma mancha na alma. Uma pessoa regenerada aborrece o pecado não somente por causa da maldição, mas também por causa do contágio. Ele odeia essa serpente não somente por causa de sua picada, mas também por causa de seu veneno. Abomina o pecado não somente por causa do inferno, mas como o próprio inferno.

4. O verdadeiro ódio pelo pecado é implacável. O cristão genuíno nunca mais se conciliará com o pecado. A ira pode experimentar conciliação, porém o ódio não pode experimentá-la…

5. Onde há verdadeiro ódio pelo pecado, nos opomos ao pecado em nós mesmos e nos outros. A igreja de Éfeso não podia suportar aqueles que eram maus (Ap 2.2). Paulo repreendeu arduamente Pedro por causa de sua dissimulação, embora este fosse um apóstolo. Com insatisfação santa, Cristo expulsou os cambistas do templo (Jo 2.15). Ele não tolerou que o templo sofresse uma mudança. Neemias repreendeu os nobres por sua usura (Ne 5.7) e pela profanação do sábado (Ne 13.17). Aquele que odeia o pecado não suportará a iniqüidade em sua família – “Não há de ficar em minha casa o que usa de fraude” (Sl 101.7). Que vergonha se manifesta quando os magistrados mostram força de espírito em suas paixões e nenhum heroísmo em suprimir o erro! Aqueles que não tem qualquer antipatia para com o pecado não conhecem o arrependimento. O pecado está neles como o veneno está em uma serpente e, por ser natural, lhe proporciona deleite.

Quão distantes estão do arrependimento aqueles que, ao invés de odiarem o pecado, amam-no! Para os santos, o pecado é um espinho nos olhos; para os ímpios, é uma coroa na cabeça – “Que direito tem na minha casa a minha amada, ela que cometeu vilezas? Acaso, ó amada, votos e carnes sacrificadas poderão afastar de ti o mal? Então, saltarias de prazer” (Jr 11.15). Amar o pecado é pior do que praticá-lo. Um homem bom pode precipitar-se cair em uma atitude pecaminosa, mas amar o pecado é desesperador. O que faz um porco amar o revolver-se na lama? O que faz um demônio amar aquilo que se opõe a Deus? Amar o pecado mostra que a vontade está no pecado; e, quanto mais a vontade estiver no pecado, tanto maior ele será. A obstinação faz com que não haja mais purificação para o pecado (Hb 10.26). Oh! quantos existem que amam o fruto proibido! Amam as imprecações e os adultérios. Amam o pecado e odeiam a repreensão… Portanto, quando os homens amam o pecado, apegam-se àquilo que será a sua morte e brincam com a condenação, isso indica que “o coração dos homens está cheio de maldade” (Ec 9.3). Isso nos persuade a mostrar nosso arrependimento por meio de um ódio amargo para com o pecado…

Componente 6: Converter-se do pecado. O sexto componente no arrependimento é converter-se do pecado… Esse converter-se é chamado de abandonar o pecado (Is 55.7), tal como um homem que abandona a companhia de um ladrão ou de um feiticeiro. É chamado de lançar para longe o pecado (Jó 11.14), como Paulo lançou de si aquela víbora, atirando-a ao fogo (At 28.5). Morrer para o pecado é a vida do arrependimento. No mesmo dia em que o crente se converte do pecado, deve se regozijar com um gozo eterno. Os olhos devem fugir de vislumbres impuros. O ouvido tem de fugir dos escárnios. A língua, do praguejamento. As mãos, dos subornos. Os pés, dos caminho das meretrizes. E alma, do amor à impiedade.

Esse converter-se do pecado implica uma mudança notável. Converter-se do pecado é tão visível, que os outros podem percebê-lo. Por isso, é chamado de uma mudança das trevas para a luz (Ef 5.8). Paulo, depois de ter recebido a visão celestial, ficou tão diferente, que todos se admiraram da mudança (At 9.12). O arrependimento transformou o carcereiro em um enfermeiro e médico (At 16.33). Ele cuidou dos apóstolos, lavou-lhes as feridas e serviu-lhes comida. Um navio se dirige ao leste; e o vento muda seu rumo para o oeste. De modo semelhante, um homem se encaminhava para o inferno, mas o vento contrário do Espírito soprou, mudou o seu rumo e o fez andar em direção ao céu… Essa mudança visível que o arrependimento produz em uma pessoa é como se outra alma se abrigasse no mesmo corpo.

Para identifica corretamente o converter-se do pecado, essas poucas coisas são necessárias:

1. Tem de haver um volver-se sinceramente do pecado. O coração é o primum vivens, a primeira coisa que vive. E tem de ser o primum vertens, a primeira coisa que se volve. O coração é aquilo por que o Diabo se empenha arduamente… No cristianismo, o coração é tudo. Se o coração não é convertido do pecado, ele não passa de uma mentira… Deus quer todo o coração convertido do pecado. O verdadeiro arrependimento não pode ter reservas nem outros ocupantes.

2. Tem de haver um volver-se de todo pecado. “Deixe o perverso o seu caminho” (Is 55.7). Uma pessoa verdadeiramente arrependida abandona o caminho do pecado. Ela deixa todo pecado… Aquele que esconde um subversivo em sua casa é um traidor da nação. E aquele que satisfaz um pecado é um hipócrita traiçoeiro.

3. Tem de haver um volver-se do pecado por motivos espirituais. Um homem pode restringir seus atos de pecados e não converter-se do pecado da maneira correta. Atos de pecados podem ser restringidos por temor ou desígnio, mas uma pessoa verdadeiramente arrependida deixa o pecado com base em um princípio espiritual, ou seja, o amor de Deus… Três homens perguntaram um ao outro o que os fizera abandonar o pecado. Um disse: “Acho que são as alegrias do céu”. Outro respondeu: “Acho que são os tormentos do inferno”. Mas o terceiro disse: “Acho que é o amor de Deus; e isso ainda me faz abandonar o pecado. Como eu ofenderia o amor de Deus?”


Extraído de The Doctrine of Repentance, reimpresso por The Banner of Truth Trust.

Fonte: Sítio da Editora Fiel